DIREITO | STJ afasta presunção de crime em caso de estupro de vulnerável

A 5ª Turma do Superior Tribunal de Justiça afastou, de forma excepcional, a presunção de ocorrência de estupro de vulnerável no caso de um adolescente condenado por manter relações sexuais com menor de 14 anos.

Decisões como essa são raras porque, para a caracterização do crime previsto no artigo 217-A do Código Penal, basta que o agente tenha conjunção carnal ou pratique qualquer ato libidinoso com pessoa menor de 14 anos.

O próprio STJ tem tese fixada em recursos repetitivos segundo a qual o consentimento da vítima, sua eventual experiência sexual anterior ou a existência de relacionamento amoroso entre o agente e a vítima não afastam a ocorrência do crime.

Relator do caso, o ministro Reynaldo Soares da Fonseca analisou as nuances do caso concreto e propôs a aplicação de um distinguishing (distinção) para a tese, pois a manutenção da condenação do jovem, que hoje tem 20 anos, a pena de 14 anos de reclusão em regime fechado, poderia causar injustiças irreparáveis.

Trata-se de réu que, adolescente, iniciou namoro com menor de 14 anos com a permissão e o consentimento dos pais dela. Desse relacionamento, resultou um filho. De forma consensual, eles decidiram morar juntos na casa dos pais do adolescente, que trabalha para sustentar a família. A vítima, por sua vez, continua estudante e deseja manter a união com o réu.

Para o ministro Reynaldo, as situações devem ser sopesadas de acordo com sua gravidade concreta e com sua relevância social, e não apenas pela mera subsunção ao tipo penal. É o que permite a aplicação do distinguishing.

O distinguishing é a prática de não aplicar dado precedente vinculante por se reconhecer que a situação sub judice (aquela que se está julgando imediatamente) não se encarta nos parâmetros de incidência do precedente.

Situações devem ser sopesadas de acordo com sua gravidade concreta e com sua relevância social, disse ministro Reynaldo Rafael Luz.

“A incidência da norma penal, na presente hipótese, não se revela adequada nem necessária, além de não ser justa, porquanto sua incidência trará violação muito mais gravosa de direitos que a conduta que se busca apenar”, concluiu.

Isso porque, a pretexto de proteger a vítima menor de 14 anos, a decisão condenatória acabaria por deixar a jovem e o filho de ambos desamparados não apenas materialmente mas também emocionalmente, desestruturando a entidade familiar que é, também, protegida constitucionalmente.

Da mesma forma, a condenação causaria danos a outro bem jurídico protegido pela Constituição: a proteção da primeira infância, já que o filho do casal seria alijado do convívio com o pai. Tudo em desconsideração aos anseios da vítima e sua dignidade enquanto pessoa humana.

“Com efeito, proclamar uma censura penal no cenário fático esquadrejado nestes autos é intervir, inadvertidamente, na nova unidade familiar de forma muito mais prejudicial do que se pensa sobre a relevância do relacionamento e da relação sexual prematura entre vítima e recorrente”, concluiu o ministro Reynaldo Soares da Fonseca.

A votação na 5ª Turma foi unânime. Acompanharam o relator os ministros Ribeiro Dantas e João Otávio de Noronha, e o desembargador convocado Jesuíno Rissato. Ausente, justificadamente, o ministro Joel Ilan Paciornik. | Publicação original: ConJur


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