CONQUISTA | Cantora faz dança erótica em sala de aula da Uesb

Uma cantora realizou uma apresentação erótica dentro de uma sala de aula da UESB (Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia).

O que aconteceu
Nas imagens, a cantora Tertuliana Lustosa, de “A Travestis”, aparece de quatro em cima de uma carteira, enquanto rebola e entoa uma canção, em ritmo de funk, com conotação adulta.

O que diz a letra da música: “Pede para o maloca dar murro na sua costela. É só uma brincadeira, diga ao pai ‘machuca ela’. Chama a travestis, que vai dar babado, chama o Elipe, que vai dar babado. Vai, maceta esse novinho do prêmio bumbum bolado. Para na posição, chacoalha o rabo. Murro, murro, murro, na costela do viado”.

A apresentação ocorreu durante um seminário. “Desfazendo gênero: conferências, mesas redondas, simpósios temáticos, mostras artísticas e muito mais”, ocorreu nas dependências da UESB em Vitória da Conquista, entre os dias 10 e 14 de novembro.

No Instagram, Tertuliana postou registros do evento, inclusive o vídeo com dança erótica, e disse ter sido “gratificante” participar do seminário. “Foi muito gratificante compartilhar esse ‘Desfazendo gênero’ com tanta gente incrível e poder falar um pouco também da minha música, outras artes, pesquisa e posicionamento, e lembrar mais uma vez o quanto tudo isso é potente demais”.

Em outra postagem, só com o vídeo de dança erótica, a artista disse: “Quando me perguntam como eu dou aula”.

Nos comentários, Tertuliana recebeu críticas. Um seguidor questionou o porquê da performance no contexto de sala de aula, e ela destacou que a apresentação se deu em um “roda de conversa, não em uma aula tradicional”. “E mesmo que estivesse [em aula tradicional], acredito que ainda temos muito o que mudar no nosso sistema tradicional que você falou. Educação não precisa ser sinônimo de chatice e caretice”, completou.

A UESB é uma universidade pública gerida pelo estado da Bahia, atualmente sob o comando do governador Jerônimo Rodrigues (PT). O UOL entrou em contato com a instituição e com a Secretaria de Estado de Educação para pedir posicionamento, mas não obteve retorno. Se as respostas forem enviadas, esta matéria será atualizada.

Tertuliana Lustosa postou pronunciamento em que chamou a repercussão de sua apresentação de “discussão inflamada”, mas ponderou que isso “abre portas para novas possibilidades de metodologias pedagógicas, onde possamos, sim, dançar e executar ações de prazer como modo efetivo de aprender”.

ORGANIZAÇÃO DO EVENTO EMITE NOTA

Leia abaixo, na íntegra:

Mediante as críticas que protagonizaram o evento DesFAZENDO Gênero, é com grande entusiasmo e comprometimento com os princípios de diversidade, inclusão e diálogo que apresentamos o que foi o VI Seminário Internacional Desfazendo Gênero. Este evento, organizado pelo Laboratório de Linguagens e Diversidade Sexual – LALIDIS, em incansável esforço do Presidente da Comissão Organizadora, Prof. Dr. Marcus A. Assis Lima, e sua equipe, foi um marco na promoção da diversidade, valorização das diversas identidades de gênero e orientações sexuais, estabelecendo-se como um dos maiores no cenário brasileiro dedicado aos estudos de gênero e sexualidade. O evento só foi possível em vista do Programa de Apoio a Realização de Eventos no País (PAEP) da Coordenadoria de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES), tendo sido contemplado em concorrido edital público.
O VI Seminário Internacional Desfazendo Gênero tem sido reconhecido não apenas como um evento acadêmico de alto nível, reunindo renomados pesquisadores da temática, mas também como um espaço inclusivo, abrindo suas portas para as pessoas LGBTQIPN+ que, muitas vezes, encontram barreiras nas instituições acadêmicas tradicionais. Este é um evento que se propõe a ser decolonial, feminista, transfeminista e a favor da dissidência sexual e de gênero, cumprindo um papel vital na construção de um ambiente mais igualitário e justo.
É nosso dever ressaltar a importância das discussões e apresentações realizadas no evento, como a fala enriquecedora de Tertuliana Lustosa, mestranda da UFBA. Sua contribuição não apenas acrescentou perspectivas valiosas ao evento, mas também exemplifica a diversidade de conhecimentos e experiências que o Seminário busca promover. Sua apresentação musical representa um pouco do que é a diversidade musical baiana, que não se prende apenas por composições encaixotadas que estão dentro de um padrão heteronormativo, e que expressa a diversidade cultural das músicas de paredões e sons automotivos que fazem parte (querendo ou não) do público LGBTQIAPN+ e da cultura baiana.
Por isso, o Presidente da Comissão Organizadora destaca a importância de criar um espaço de acolhimento para pessoas que, muitas vezes, são marginalizadas no meio acadêmico. Ele salienta que o evento foge dos moldes tradicionais, acolhendo pessoas que enfrentam dificuldades para acessar a educação superior, como travestis, transexuais e intersexo.
Além disso, a diversidade da programação do VI Desfazendo Gênero, que incluiu Simpósios Temáticos, mesas-redondas, oficinas e atrações artísticas, contando com mais de trezentos inscritos de todas as regiões do Brasil, demonstra o compromisso do evento em abordar as mais diversas perspectivas e promover uma visão abrangente sobre as questões de gênero e sexualidade. Destacamos ainda os lançamentos literários e outras atrações artísticas que enriqueceram ainda mais a experiência do evento.
Por fim, reforçamos que o VI Seminário Internacional Desfazendo Gênero é um espaço para a construção de saberes, o fomento do diálogo e a promoção da diversidade.
O fato ocorrido, durante uma mesa redonda intitulada “Desterritorializ[ações] queer: subjetividades, corpos dissidentes e outros flertes de experiências de si”, nada tem de pornográfico, obsceno ou aviltante. Foi realizado em uma mesa redonda que durou quatro horas, com outras e outros pesquisadores. Tertualiana integrava a mesa por ser mestranda na UFBA, artista e travesti. O evento foi assistido por adultos que, como mostra o recorte de vídeo, não se sentiram ultrajados ou chocados.
A Universidade é laica, gratuita, de qualidade e socialmente referenciada, o que inclui as/os transsexuais, as travestis e os intersexo. O Desfazendo Gênero reconhece os conhecimentos “ordinários”, produzidos nas margens da sociedade ou da própria Universidade. Sua proposta é decolonial e transfeminista. Nele, o subalterno pode falar.

 


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