ARRAIÁ DA CONQUISTA | Tierry, o “pai das crianças”, reúne milhares de fãs com sua “sofrência feliz”

Antes de subir ao palco do Centro Cultural Glauber Rocha nesta sexta-feira (23) para se apresentar na quarta e última noite do Arraiá da Conquista, o cantor e compositor Tierry recebeu as boas-vindas da prefeita Sheila Lemos no camarim: “A galera está toda aí te aguardando com muita ansiedade. Desejo que você volte sempre a Vitória da Conquista. A cidade te ama”.

Tierry, nascido em Salvador, devolveu a gentileza: “Sou extremamente apaixonado por Vitória da Conquista. É um povo maravilhoso que sempre me acolhe. Tenho muitos amigos aqui”.

No exato momento em que o artista agradecia à prefeita e se preparava para iniciar o show, duas filas imensas se arrastavam pelos dois lados do Centro Cultural Glauber Rocha. Eram centenas de pessoas que ainda tinham esperanças de entrar no local, onde a lotação completa, estimada em mais de 25 mil pessoas, já estava próxima de ser atingida.

Como o próprio artista gosta de dizer, eram muitas “crianças” com a esperança de ver de perto o “pai” – ele, Tierry, autodeclarado “Pai das Crianças”. Mas como explicar que tantas pessoas gostem de suas canções e ouçam, com o volume nas alturas, suas inúmeras composições? A resposta talvez esteja no que disse a estudante Tainara Dias da Silva, 18 anos, que chegou cedo ao Centro Cultural Glauber Rocha ao lado das amigas.

Ela reconheceu não ser muito fã de forró, e que estava ali por um único motivo. “Eu vim por causa dele”, disse, referindo-se a Tierry. E por quê? Eis a resposta-síntese de Tainara: “A música dele, tipo, bate muito com a minha realidade, sabe?”

Pronto, aí está a explicação. Entre as pessoas ávidas por vê-lo e ouvi-lo, havia certamente muitas “Ritas” que, em algum momento da vida, ouviram de seus pares pedidos humilhantes para que voltassem para eles. Talvez houvesse também homens que já haviam perdoado certas agressões de que haviam sido vítimas, apenas para ter de volta a mulher que diziam amar. Da mesma forma, poderiam estar ali muitas pessoas que alguma vez sentiram vontade de dizer que foram “hackeadas”, ou que julgaram que suas mensagens tinham sido “jogadas na lixeira” – quem nunca passou por isso?

Aí está: compositor de sensibilidade apurada, Tierry sabe como fazer canções que trazem situações vivenciadas diariamente por milhões de pessoas. Por se identificarem, essas pessoas ouvem suas músicas, gravadas por ele próprio ou por outros artistas, como a dupla sertaneja Jorge & Matheus e a cantora Marília Mendonça, entre inúmeros outros. Afinal, Tierry é uma espécie de usina de composições.

Claro que o cantor arrisca uma explicação para o sucesso. “É sempre assim. Quando a gente fala a verdade do povo, a gente perdura. Acho que essa é a grande chave do meu trabalho: falar da história das pessoas, contar a vida delas. E de uma forma divertida, engraçada. Muitas vezes, meus amigos falam que eu sou a sofrência mais feliz que eles conhecem. E eu fico muito feliz com isso”, disse Tierry.

Eis o que faltava para compreender a sintonia entre o artista e o público que lotou o Centro Cultural Glauber Rocha na última noite do Arraiá da Conquista. Além dos que ouviam nas canções uma tradução do seu próprio sofrimento por amor, e, por isso, usavam-nas para afogar as mágoas, havia também aqueles que se identificavam com elas por “zoeira”. Havia homens grisalhos que se acostumaram a ser chamados de “Velhos da Lancha”, mesmo que, em muitos casos, não sejam proprietários nem mesmo de uma bicicleta.

E havia jovens que, depois de ouvir a canção, passaram a tratar seus pais, avôs, tios ou amigos por esse apelido – somente por terem os cabelos alvos como algodão. Houve, por fim, os que se emocionaram ouvindo clássicos do forró e até mesmo do universo sertanejo.

Mas, por fim, não se trata de uma ciência exata. Há apenas a identificação sentida por Tainara em relação a Tierry, compartilhada com os milhares de fãs que foram ao Arraiá da Conquista e com os milhões que ouvem, sofrem, riem e se deliciam com suas composições.


COMPARTILHAR