Terreno da APAE de Conquista foi vendido ilegalmente; instituição, em crise, pode fechar as portas

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Imagens: Redes sociais/acervo
Os hóspedes do luxuoso Hotel Íbis, suntuosamente erguido na Avenida Juracy Magalhães, ao Shopping Conquista Sul, em Vitória da Conquista, certamente ficariam indignados ao saberem que, mesmo indiretamente, estão contribuindo para o iminente fechamento da APAE (Associação dos Pais e Amigos dos Excepcionais) local por falta de recursos financeiros. 

É certo que o hotel não tem culpa direta, mas para entender a história é preciso voltarmos na história do terreno, marcada por desmandos, conivência e desvios da então gestão da APAE, em 1999. O Íbis preferiu não se manifestar sobre o assunto.

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Em lugar do Íbis Hotel, ali deveria estar as instalações da Apae de Vitória da Conquista, instituição filantrópica fundada em 1º de março de 1977. Na verdade, o terreno (dois lotes), localizado no Loteamento Jardim Guanabara, era do Serrano Tênis Clube, que doou à Apae em 1987. O plano inicial era construir uma nova sede, com amplas instalações, inclusive de educação, treinamento, entretenimento e lazer. 

De forma irresponsável, na calada da noite, o terreno de mais de 27 mil metros quadrados foi posto à venda, de forma irregular, com anuência da então administração de Carlos Rezende de Santana e à revelia do conselho diretor, privando mais de 500 alunos portadores de deficiências e seus respectivos familiares de um espaço amplo.

Nos últimos dias o “fantasma”  do terreno voltou a rondar a APAE, que
funciona há mais de 40 anos no município. Em contato com o o apresentador  Massinha, do programa Agito Geral, a diretoria
tornou pública a situação de penúria que afeta financeiramente a entidade.
“ Não é exagero, é uma triste
realidade. Quem vê aquela casa enorme que acolhe 540 pessoas, onde recebem
assistência pedagógica, psicológica, saúde, além de muito carinho, não imagina
que todas as portas podem fechar. Só não o fez “por milagre de Deus e ajuda de
empresários e associados voluntários”, disse a presidente executiva, que também
tem um filho excepcional que chegou a instituição aos oito anos de idade e hoje
está com 28.

“As verbas do município, do Estado
e federal não estão sendo repassadas. Os entraves são vários. Além de faltar
disposição política, a burocracia é grande. Desde a última gestão municipal que
os repasses são parciais. O prefeito Herzem começou a nos atender”, emendou. Segundo a diretoria da APAE, “são
quase 60 funcionários, profissionais que servem a instituição e que dependem
dos salários”.



HISTÓRIA REVOLTANTE


“Doze anos depois, em 1999 (ata da reunião de diretoria de 12 de fevereiro), a presidente da Apae, na época Jandira Braga Rodrigues Veloso, colocou em proposta a venda da área, alegando que a instituição beneficente e filantrópica passava por dificuldades financeiras”, recorda o jornalista Jeremias Macário, que sucedeu a antiga diretoria acusada.
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O jornalista jeremias Macários denunciou a venda irregular do terreno da APAE
“A proposta chegou a ser questionada, mas diante dos “argumentos” da presidente, terminou sendo aceita, e o terreno foi vendido à JMC – Indústria e Comércio de Artefatos e Metais Ltda, na pessoa do sr. Galmar Souza de Oliveira, por meros R$50 mil, parcelados em dez cheques de R$5 mil cada. Boa parte desse dinheiro, se é que foi pago, não entrou até hoje na contabilidade da Apae. Simplesmente sumiu. Consta que na época foi feita uma avaliação e, por baixo, o imóvel valia cerca de R$200 mil”, sustenta.
Numa avaliação feita por uma imobiliária, em 2008, o valor da área foi calculado em mais de  R$ 4 milhões.
Macário seguiu sustentando a tese de irregularidade, ao afirmar que “por sua vez, a transação se deu de forma irregular (um dos sócios da empresa era marido da presidente), pois reza o estatuto da Apae que um bem patrimonial só pode ser vendido depois de ouvida e autorizada pela Assembléia Geral”. No início dos anos 2000, em matéria jornalística, a Sucursal A Tarde de Vitória da Conquista denunciou o fato.
Antes de o caso ir parar nas esferas judiciais, em 4 de janeiro de 2001 a empresa JMC vendeu a “propriedade” para o empresário e cafeicultor Antônio Romário Aguiar dos Santos. Ao ser provocado sobre a situação, o Ministério Público do Estado entrou com uma ação civil pública contrária a operação, embora esclarecendo que uma ação de improbidade administrativa contra os responsáveis só caberia quando um patrimônio é adquirido através de subvenções públicas, o que não era o caso.
Mesmo assim, quatro anos depois o Ministério deu parecer de que dos autos da ação existiam fortes indícios de que a alienação representou dilapidação patrimonial da Apae, fruto de uma administração desastrosa. O promotor Valtércio Pedrosa recomendou que a entidade deveria promover as medidas necessárias à recomposição do seu patrimônio, cabendo uma ação comum.
Como diante dessa interferência do MP, o terreno ficou indisponível para qualquer negociação, inclusive fazer hipoteca no banco, em 2005 Antônio Aguiar dos Santos entrou com uma ação de embargos de terceiros contra a Apae e a JMC, na 2ª Vara Civil do Fórum João Mangabeira.
ASSINOU E NÃO COMPARECEU
“No cumprimento do seu dever, a juíza Simone Soares de Oliveira Chaves, no dia 8 de abril de 2005, determinou que a Apae fosse citada para tomar as devidas providências. A intimação para comparecer ao Fórum, no prazo legal, foi assinada em 21 de outubro de 2005, pelo sr. Carlos Rezende de Santana, então presidente da Apae na época, só que ele não foi ao Fórum, nem tomou as medidas jurídicas cabíveis”.
Como não foi feita nenhuma petição por parte da Apae, entre 21/10/2005 a 21/12/2005, conforme certidão emitida pelo subescrivão Wailly José dos Santos Freitas, em 12 de abril de 2006, a juíza deu sua sentença, julgando procedente o embargo de terceiros e colocando o imóvel em disponibilidade, o que significou o cancelamento da restrição judicial.
“Em outras palavras: o sr. Antônio Aguiar poderia fazer o que bem quisesse  com o terreno. A juíza alegou que os réus (Apae e JMC) foram citados, tendo deixado transcorrer o prazo para a contestação. Não se sabe se o ato foi intencional, de má fé ou negligência”, continuou.
Segundo o jornalista, em artigo publicado nas redes sociais, “em nenhum momento do processo, o sr. Carlos Rezende nos disse que a Apae havia sido citada em 2005. Só depois, em 2008, soubemos do fato quando a juíza da 2ª Vara Civil levou ao nosso conhecimento a sentença dada em 2006”. À época Carlos Rezende afirmou aos diretores que “não se lembrava da intimação”.
Mesmo assim, a advogada tentou entrar com recurso de apelação contra a decisão, mas carecia do consentimento de Carlos Rezende como procurador da Apae. 
“Evitando que na frente fosse julgado pela sua negligência e outros fatos decorridos (sua esposa havia assinado a venda do terreno), o presidente negou a procuração e a prosseguir com a ação. Assim ficamos sem o nosso terreno, onde foi erguido um luxuoso hotel”, finalizou. A reportagem não conseguiu localizar os antigos gestores citados na reportagem, assim como os reposnáveis pela aquisição do terreno.


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