Os espaços vazios no compartimento onde as bolsas de sangue dos doadores são guardadas dão o sinal de que o estoque não vai bem. Quatro tipos sanguíneos estão em estado crítico nas unidades da Fundação de Hematologia e Hemoterapia da Bahia (Hemoba). Outros dois estão em alerta.
A situação fica ainda mais complicada porque cerca de 6% do material doado é descartado no estado. Isso acontece quando o sangue não atinge os parâmetros sanitários estabelecidos.
A fisioterapeuta Layla Cupertino, de 32 anos, tem o hábito de doar sangue duas vezes ao ano, desde que se tornou maior de idade. Ao longo de quase 15 anos, a profissional de saúde estima ter feito a doação quase 30 vezes. O procedimento é sempre o mesmo: responde perguntas, passa pela triagem e é direcionada ao local de coleta. Para Layla, o processo termina em minutos. A fisioterapeuta só voltará depois de alguns meses.
É quando os doadores deixam os bancos de coleta, no entanto, que uma série de processos tem início. Até chegar ao receptor, o sangue doado passa por testes estabelecidos pelas autoridades de saúde. São eles que garantem a segurança de quem vai receber o material. A testagem inclui identificação das doenças infectocontagiosas hepatites B e C, HIV, sífilis, doença de chagas e malária.
O material só é considerado apto para doação se os testes derem negativo. Em caso de diagnóstico positivo ou indeterminado, o sangue é descartado. Em junho deste ano, 285 bolsas de sangue foram descartadas na Bahia. A quantidade de material que não pôde ser utilizado representa 6% do total de doações, que foi de 4,7 mil bolsas no mês passado, segundo o Hemoba. O sangue descartado poderia ter ajudado a salvar a vida de até 1.140 pessoas, já que cada bolsa pode ser destinada para até quatro receptores.
Cada bolsa de sangue possui 450 ml Crédito: Marina Silva/CORREIO
“Os procedimentos que os serviços de hemoterapia realizam atendem políticas de biossegurança do Ministério da Saúde. Todo sangue doado é submetido a testagem de doenças que podem ser transmitidas através da transfusão”, explica Aline Dórea, médica hematologista do Hemoba. “A legislação obriga que sejam utilizados métodos muito sensíveis para garantir a segurança de quem vai receber a transfusão”, completa.
As bolsas descartadas em um mês pelo Hemoba correspondem a 128,25 litros de sangue – isso porque cada bolsa contém 450 mililitros do material. A quantidade é equivalente ao total de sangue que circula pelo corpo de 25 pessoas de 70 quilos. Cada indivíduo com esse peso tem, em média, cinco quilos.
A última atualização do Hemoba indica que o estoque dos sangues tipo B+, B-, O+ e O- estão críticos. Os tipos A+ e A- estão em alerta. Apenas os tipos AB+ e AB- estão em níveis considerados estáveis.
Desde o início deste ano, os hemocentros de todo o país tiveram que incluir a malária na lista de doenças que são testadas pelo método de teste de ácido nucleico (NAT). O exame é mais seguro pois detecta doenças que estão no organismo há menos tempo, como explica a hematologista Aline Dórea.
“O NAT detecta o material genético do vírus e a vantagem é que a janela imunológica é reduzida. A partir do momento que o indivíduo entrava em contato com o HIV, por exemplo, ele podia demorar até seis meses para positivar nos exames mais antigos”, diz. Na prática, uma pessoa poderia doar sangue contaminado durante um semestre sem que a doença fosse percebida. “O teste NAT diminuiu a janela imunológica para 10 a 20 dias”, ressalta Aline Dórea.
Além da testagem para doenças, outras análises são consideradas. Pode ocorrer descarte de bolsas de sangue quando o nível de gordura é elevado ou quando ocorre hemólise, a destruição de hemácias. “São vários os motivos pelos quais ocorrem perdas durante os processos. Não é 100% do que coletamos que vamos conseguir transfundir. O índice está dentro do aceitável, considerando todos os fatores”, ressalta Luiz Catto, diretor geral do Hemoba.
Apesar de a porcentagem de sangue descartado ser considerada dentro da média, o descarte prejudica os estoques que já têm nível crítico. No ano passado, mais de 130.168 voluntários doaram sangue na Bahia. O número ainda está longe do ideal. Para que o estoque do Hemoba esteja sempre abastecido, seria preciso 180 mil doadores baianos por ano e uma média de 500 bolsas coletadas diariamente.
O professor Jorge Costa doou sangue pela primeira vez durante a pandemia. Ele foi incentivado por um amigo, que faz campanhas pela doação há alguns anos. A ação daquele primeiro dia fez com que a doação se tornasse um hábito. Desde então, Jorge Costa doa uma parte de si a cada três meses.
“No início dá um certo medo, mas o processo é muito seguro e tranquilo. Promove uma sensação de bem estar ao final, sabendo que poderá ajudar a salvar vidas”, diz.
Quem pode doar sangue
- Estar em boas condições de saúde e pesar acima de 50 kg;
- Apresentar documento original com foto, emitido por órgão oficial e válido em todo o território nacional
- Ter entre 16 e 69 anos de idade, sendo que menores de 18 anos devem estar acompanhados por um responsável legal
- Pessoas com mais de 60 anos só poderão doar caso já tenham realizado uma doação antes dos 60 anos
- Homens podem doar até 4 vezes a cada 12 meses, com intervalo mínimo de 60 dias entre as doações e mulheres podem doar até 3 vezes a cada 12 meses, com intervalo mínimo de 90 dias entre as doações
Recomendações para o Dia da Doação
- Estar descansado (ter dormido pelo menos 6 horas nas últimas 24 horas)
- Estar alimentado (evitar alimentação gordurosa nas 4 horas que antecedem a doação)
- Não ingerir bebida alcoólica nas últimas 12 horas
- Não fumar por pelo menos 2 horas
Impedimentos Temporários
- Se você estiver gripado, resfriado, com febre, espere 15 dias após o desaparecimento dos sintomas
- Estar grávida
- Período pós-gravidez (90 dias para parto normal e 180 dias para parto cesariano)
- Período de amamentação (durante os primeiros 12 meses)
- Tatuagem e/ou piercing nos últimos 12 meses (piercing em cavidade oral ou região genital impede a doação)
- Ter feito exames/procedimentos endoscópicos nos últimos 6 meses
- Situações nas quais há maior risco de adquirir doenças sexualmente transmissíveis; aguardar 12 meses
Impedimentos Definitivos
- Quem teve diagnóstico de hepatite após os 11 anos de idade
- Evidência clínica ou laboratorial das seguintes doenças transmissíveis pelo sangue: hepatite B e C, AIDS (vírus HIV), doenças associadas aos vírus HTLV I e II e doença de chagas
- Uso de drogas ilícitas injetáveis.
Com informações do Correio 24h / Maysa Polcri