Reportagem do Sudoeste Digital sobre jogos ilegais é pauta do Fantástico; saiba antes aqui

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Uma
equipe da Rede Globo, liderada pelo jornalista baiano José Raimundo (Rede
Bahia) vai mostrar no Fantástico desse domingo, 13, como uma
Zebra no
Brasileirão causou prejuízos milionários a casas de apostas ilegais. A
investigação, inicialmente feita pela jornalista
Jussara Novaes, do Sudoeste
Digital
, será o ponto de partida para a reportagem da Rede Globo.

Para entender o caso, conforme apurado pela
jornalista, com informações do também jornalista Mateus Simoni, a
quarta-feira, 12 de julho, primeiro
dia de jogos da 13ª rodada do Campeonato Brasileiro, terminou com o Whatsapp
inundado de áudios da mais pura alegria.

Afinidades
futebolísticas nada tiveram a ver com isso. As vozes não comemoravam
especificamente a vitória do Corinthians sobre o Palmeiras, no Allianz Parque,
ou o 1 a 0 do Botafogo para cima do Fluminense. Comemoravam a mais mundana das
conquistas: dinheiro. “Prepara o churrasco aí, o biscoito na sexta-feira.
Ganhamos R$ 32 mil!”, dizia um deles.

Aquela
quarta-feira foi um dia excepcional no mundo das probabilidades. Houve seis
jogos, com seis vitórias dos visitantes: Santos, Bahia, Botafogo, Corinthians,
Cruzeiro e Vasco da Gama ficaram com os três pontos.

Azar
dos mandantes, e azar maior ainda das casas de apostas informais – e ilegais –
do Nordeste, onde esta prática é mais difundida do que em outros centros do
país. O incrível sexteto de vitórias na estrada garantiu prêmios que pagavam de
1.000 a 2.200 vezes o valor investido para quem se arriscou na aposta casada,
quando você combina dois ou mais resultados em busca de uma cotação maior. Isso
significa o seguinte: apostou R$ 10? Levou até R$ 22 mil.

Pirâmide

INVESTIGAÇÃO NA BAHIA
Os
apostadores mais prejudicados na Bahia estão espalhados pelas regiões de
Itapetinga, Itororó, Potiraguá e Itabuna – neste último onde funcionava a D9, que
teve bens apreendidos após investigação da Polícia Civil, no último dia 4. A operação
visava prender envolvidos no esquema criminoso, que também utilizava apostas
ilegais para obtenção de lucro indevido.
Eles usavam o
futebol como chamariz para o velho esquema de pirâmide. Diferente do que ocorre
nas bancas de apostas em outras regiões do Nordeste, o grupo agia na cidade de
Itabuna e vendia pela internet uma cota para atrair novas vítimas, com a
promessa de dinheiro rápido assistindo a jogos de futebol e apostando ao vivo
em partidas em um ambiente virtual — no que se convencionou chamar de trading
esportivo.
Segundo a
polícia baiana, o esquema criminoso movimentou cerca de R$ 200 milhões. Os
envolvidos, que ainda não foram presos, vão responder pelos crimes de
estelionato, formação de quadrilha, lavagem de dinheiro e pichardismo (crime contra a economia popular, cometido por empresas
que, falsamente, prometem devolver, após certo tempo, o dinheiro de mercadorias
que o cliente comprou)
. Ninguém foi preso até o momento.
Funcionava assim: o grupo, batizado de D9 clube, informava em
vídeos virais em seu site e nas redes sociais que o percentual de lucro obtido
com as realizações das apostas de seus clientes poderia render 33% sobre o
valor investido, caso fosse efetuado um pagamento semanal durante um ano.
Ao final do
ciclo, o valor principal investido poderia ser sacado pelo usuário. Acontece
que, como é matematicamente impossível manter 100% de acertos por tanto tempo,
boa parte dos lucros eram obtidos pelas cotas pagas por novas vítimas do
esquema.
A divulgação
dos resultados da 13ª rodada deixou milhares de apostadores empolgados com a
possibilidade de faturar uma renda extra, muitas vezes bem maior do que seus
salários. A sensação era de ter ganhado na loteria, com prêmios citados na casa
dos cinco dígitos.

Mas esse
sentimento durou pouco tempo. Os proprietários de sites e bancas ilegais de
apostas esportivas logo admitiram que não havia outra solução senão fechar as
portas, diante da impossibilidade de pagar tantos prêmios milionários. No
entanto, como a atividade é ilegal, e os administradores das bancas não
aparecem, por razões óbvias. Sobrou para os cambistas a missão de tentar, em
vão, aplacar a irritação dos vencedores.



Em vídeo gravado, supostamente fora do Brasil, dono da D9 diz que foi vítima de “extorsão”

“A verdade virá à tona. Tentaram me extorquir, mas não deu certo. Foram tentar pelas vias legais”. Este é o desabafo de Danilo Santana, dono da D9, empresa investigada há seis meses, pela Polícia Civil de Itabuna. Tida como pirâmide financeira, a D9 foi, inclusive, alvo de uma operação batizada de Gizé. A ação, realizada semana passada, culminou com o cumprimento de mandados de busca e apreensão.
Danilo publicou um vídeo, no qual afirma ter sido “vítima” de extorsão. Entretanto, ele não revela quem teria tentado “prejudicá-lo”. O homem também negou ter recebido ordem de prisão.
Segundo a investigação, a empresa causou prejuízos calculados em, aproximadamente, R$ 200 milhões. Muitos investidores chegaram a procurar a delegacia para prestar queixa contra a D9, alegando que não conseguiram sacar o valor prometido nos investimentos.
Sempre usado o termo “algumas pessoas”, Danilo fala que “usaram” a operação de forma tendenciosa. O fato de não apontar ninguém em suas declarações pode ser um indicativo de que o empresário esteja tentando colocar “panos quentes”, para aliviar o escândalo e não perder mais investidores.
Danilo garante que não está no Brasil, “por questão de proteção”. Segundo ele, estão acontecendo “algumas coisas” arbitrárias, porém não disse quais coisas seriam essas, deixando, mais uma vez, um rastro de dúvidas, quanto à sua credibilidade. “Eu acredito no Brasil e em minha cidade, Itabuna”.
Confira a íntegra do vídeo a seguir.

Colaborou: Verdinho Itabuna

Apostas no esporte (foto: Getty)
PREJUÍZO MILIONÁRIO
“Pessoal, não adianta me ligar, me pressionar, mandar mensagem. Já
entrei em contato com o dono da banca e ele falou que é impossível pagar. O
prejuízo é milionário. Não vai ter condição de pagar. E vocês sabem que é jogo
ilegal. Não adianta ir à Justiça, não adianta fazer nada. Fechou a tampa do
caixão, não vai ter condição de pagar”, diz um cambista em uma mensagem de voz.
Em outro áudio, um cambista estima um prejuízo de no mínimo R$ 2
milhões.
E não adianta
reclamar: de acordo com o advogado especialista em direito do consumidor e
professor da Faculdade Baiana de Direito, Aurisvaldo Melo, os apostadores que
não receberam o dinheiro não têm a quem recorrer. Com isso, o apostador amarga
também o prejuízo de não poder ir à Justiça com ações que pleiteiam o pagamento
dos prêmios ilegais.
“Quem atua assim está no âmbito da ilicitude e, portanto, não
possui nenhuma proteção jurídica. Nessa medida, o eventual ganhador de um jogo
dessa natureza não pode se valer do Judiciário para exigir o pagamento de
quantia que tenha conquistado numa atividade dessa natureza. Não há
jurisprudência favorecendo esse eventual ganhador, até porque, se assim fosse,
aplicaríamos o mesmo para o jogo do bicho. Quem atua assim sabe que está
atuando por sua própria conta e risco”, alerta Melo.

Legislação arcaica e necessidade de atualização

Este
mercado informal estabelece-se em bancas físicas nas ruas do Nordeste e por
meio de vendedores ambulantes, que promovem páginas hospedadas no Brasil. Após
acessar o site ou consultar a banca, o apostador escolhe em quais jogos quer
investir, tendo ao seu dispor um cardápio variado de opções: do simples
resultado ao número de gols ou até escanteios.

Com
um bilhete gerado, o “cliente” dirige-se até um cambista, que fica responsável
por validar a aposta e receber o dinheiro. Boa parte dessas bancas também atua
no jogo do bicho – outra prática proibida pela legislação brasileira. A
modalidade é mais facilmente encontrada em cidades do interior ou em bairros
periféricos das capitais.

As
bancas ficam à frente de pequenas lojas ou dentro de mercadinhos, onde é
possível comprar leite, salgadinho, refrigerantes ou apostar no milhar do jogo
do bicho. “A gente começou tem pouco tempo”, afirma à reportagem o dono de um
estabelecimento, que pediu anonimato.

“Já
teve gente que ganhou R$ 2 mil aqui nesta banca, mas a gente sabe que não pode
aparecer muito. É arriscado. Posso perder toda a loja. Eu só vendo porque não
tem jeito. Só vendo porque tem quem compre”.

Há, porém, um
problema muito maior por trás destas apostas. Por serem ilegais, as bancas por
si só já se enquadram em uma contravenção penal. A legislação do Brasil proíbe
o funcionamento de cassinos, considerados como “jogos de azar”, sejam eles
físicos ou virtuais.

Também é
vedado o exercício de apostas em eventos esportivos como jogos de futebol, com
a exceção de jogos patrocinados pelo próprio governo brasileiro, como a Loteca
ou a Timemania.
Segundo o mestre em Direito Penal e professor universitário,
Cristiano Lázaro, a legislação brasileira não acompanhou a modernização da
sociedade. “As leis penais surgem na ideia de coibir condutas que podem lesar a
sociedade em determinado tempo e momento histórico”.
Contudo, em
relação a essas leis, elas não estão de acordo com a sociedade atual. Para ele,
a prática chega a ser “tolerada” em algumas cidades baianas. “Na Bahia, não há
muitos casos desses”, afirma Lázaro, que ressalta que as práticas não possuem o
mesmo rigor para se punir em comparação com outros crimes de patrimônio, como
roubo e furto.
Colaborou:
Matheus
Simoni


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