POSIÇÃO NEGATIVA | Conquista está com Plano Diretor de Desenvolvimento Urbano e Lei de Ordenamento do Uso e da Ocupação do Solo desatualizados

Um levantamento feito pelo Bahia Notícias revelou que, dentre as dez maiores cidades do interior da Bahia em número de habitantes, mais da metade estão com o Plano Diretor de Desenvolvimento Urbano (PDDU) e/ou a Lei de Ordenamento do Uso e da Ocupação do Solo (Louos) desatualizados. Conquista faz parte da lista negativa.

O prazo estabelecido constitucionalmente para a revisão dos instrumentos legais é de no máximo 10 anos. Em alguns casos, a última atualização foi em 2003, o que pode resultar em crime de improbidade administrativa para o gestor municipal. 

A pesquisadora em direito público, mestra em planejamento ambiental e doutoranda em Sociedade, Economia, Estado e Ambiente pela Universidade de São Paulo (USP) Vinnie Ramos explica que estes instrumentos legais são essenciais para o bom funcionamento e desenvolvimento socioambiental dos municípios brasileiros. 

“É basicamente um documento base de orientação do desenvolvimento dos municípios. O PDDU visa, de certa forma, oferecer uma qualidade de vida para todo cidadão. Para que uma cidade cresça de forma ordenada e que contemple todos as nossas demandas e dinâmicas socioambientais, precisamos de definições prévias a cerca dessas prioridades definidas pelo município e também da destinação do uso do território”, explicou.

De acordo com a determinação constitucional, os municípios brasileiros com população igual ou superior a 20 mil habitantes têm obrigação de renovar, em um prazo máximo de dez anos, o PDDU e a Louos, norma que integra o plano diretor. 

O Bahia Notícias entrou em contato com as prefeituras, secretarias municipais de infraestrutura e desenvolvimento urbano das cidades de Feira de Santana, Vitória da Conquista, Camaçari, Juazeiro, Itabuna, Lauro de Freitas, Teixeira de Freitas, Ilhéus, Barreiras e Jequié e constatou que seis destes municípios descumprem o prazo estipulado. 

“O prefeito que não toma essas providências incorre em improbidade administrativa, de acordo com o artigo 52 do estatuto das cidades”, explica a professora. Improbidade administrativa é o ato ilegal ou contrário aos princípios básicos da Administração Pública no Brasil, cometido por agente público, durante o exercício de função pública ou decorrente desta.

Os  documentos mais desatualizados datam de 2003. São os municípios de Teixeira de Freitas e Juazeiro. Após ser provocada pelo Bahia Notícias, a prefeitura de Juazeiro informou, por meio de que nota, que, através da Secretaria de Meio Ambiente e Ordenamento Urbano (Semaurb) e da Secretaria de Obras e Desenvolvimento Urbano (SEDUR), providenciou o início dos trâmites para o processo de atualização do PDDU, elaborando um Termo de Referência, que é um documento base com sugestões de medidas que a administração deve desenvolver para efetivar a atualização do plano diretor. 

“Este documento foi remetido à Procuradoria Geral do Município, para análise e ajustes e, posteriormente, será encaminhado ao Ministério Público do Estado da Bahia”, diz a nota. A resposta reconhece o atraso e informa que “a atual gestão municipal tomou conhecimento da existência de um Termo de Ajustamento de Conduta (TAC), expedido pelo Ministério Público, cobrando a atualização deste instrumento básico da política de desenvolvimento e expansão urbana do município, conforme diretrizes do Estatuto das Cidades, que prevê que a cada 10 anos o Plano Diretor deve ser atualizado”. 

Por meio de assessoria de imprensa, a prefeitura de Teixeira de Freitas também reconheceu que tanto o PDDU quanto a Louos deveriam ter sido atualizados em 2013. No entanto, argumentou que “não houve essa movimentação por parte das gestões anteriores”. “O gestor atual de Teixeira de Freitas tem interesse em fazer essa atualização e já houve essa sinalização para a Secretaria de Projetos Estratégicos, porém, o processo requer licitação, diálogo e participação da comunidade e tempo. Portanto, em 7 meses de governo ainda não foi possível iniciar o processo, visto que a gestão foi entregue com muitas dívidas e problemas bastante urgentes”.

Em seguida no ranking dos desatualizados, estão as cidade de Vitória da Conquista e Ilhéus, com documentos revistos pela última vez em 2006. De acordo com o secretário de infraestrutura de Conquista, Jackson Apolinário Yoshiura, o PDDU da cidade é de 2006, já a Louos, data de 2007, com um lei complementar em 2015.

Questionado pelo atraso, o secretário informou que assim que o governo assumiu a gestão, deu início a revisão dos instrumentos. “Tivemos a pandemia. Atrasou um pouco. E vamos concluir agora em 2021. O último ajuste está sendo feito. E estamos aguardando o retorno das atividades de legislativo”, disse. 

Já o secretário de infraestrutura de Ilhéus, Vinícius Pinto informou que a cidade revisou a Louos pela última vez em 2015. Já em relação ao PDDU, ele disse que a gestão já iniciou o processo de revisão e que aguarda maiores definições do Porto Sul e da  Fiol para que, com base na nova realidade urbanística, o documento “já nasça atualizado”.  Em relação ao Louos, o secretário declarou que há uma revisão tramitando na Câmara de Vereadores. “Já houve duas audiências públicas, e está aguardando votação”, disse. 

A pesquisadora Vinnie Ramos lembra que cabe ao prefeito apresentar um projeto de lei  consistente, feito com a participação popular e em tempo hábil sobre a atualização dos instrumentos. De acordo com ela, as revisões tendem a durar em média seis meses.  “É um processo complexo que demanda vários seguimentos da população e que leva um tempo razoável para ser elaborado. Uma média de 6 meses. Daí esse projeto é remetido para a Câmara para que eles possam deliberar sobre a proposta. Aprovando ou retificando o documento”, explica. 

Ramos explicou também que a Lei de Ordenamento do Uso e da Ocupação do Solo (Louos), e outros instrumentos legais como o Plano Plurianual e a Lei Orçamentária Anual, integram o plano diretor. “O PDDU versa sobre várias dimensões como saúde, moradia, mobilidade e território. Quando falamos de saúde destacamos, por exemplo, o saneamento básico. Em tempos de pandemia, são condições mínimas de sobrevivência. A própria Louos precisa estar alinha com o PDDU para que propostas de saneamento básico e a delimitação de áreas de morados, sejam efetivas. Geralmente, quando um é atualizado, o outro também é”, lembrou. 

Em Jequié, o PDDU em vigor é de 2007. O secretário de infraestrutura Celso Galvão explica que a gestão visa atualizar os instrumentos. “A gestão que iniciou agora está envidando esforços para fazer a atualização de toda essa pauta. Tivemos revisões em algumas leis, mas estamos fazendo revisão de toda essa pauta agora, para logo atualizar esse conjunto de leis”, disse. 

As cidades de Camaçari e Itabuna atualizaram pela última vez os PDDUs em 2008. Camaçari, na Região Metropolitana de Salvador (RMS) chegou a ser cobrada em maio deste ano pelo Ministério Público da Bahia (MP-BA) para que revisasse o documento (relembre). À época, a gestão informou que tem feito a coleta de dados junto à população para a revisão do documento (veja). A reportagem do BN tentou contato com a gestão para saber como está o processo de atualização e o porquê do atraso, mas não obteve retorno.  

Apesar do atraso no PDDU, Itabuna atualizou em 2018 a Louos. Até o fechamento desta matéria a prefeitura de Itabuna não informou se o PDDU está em processo de atualização.  

A pesquisadora em direito público Vinnie Ramos lembra que o prefeito que negligencia a atualização incorre em improbidade administrativa. “Nesse caso caberia o enquadramento no caso das categorias dos atos que atentam contra os princípios da administração pública que incluem ação ou omissão, violar os deveres de honestidade, lealdade às instituições, legalidade as instituições. A inobservância ou desrespeito desse prazo assinalo em lei é um evidente desrespeito ao principio da legalidade. Se não há uma observância sobre o prazo legal de 10 anos”, disse. 

O gestor pode ainda ser punido com a suspensão dos direitos políticos, ser submetido ao pagamento de multas, proibição de contratar com o poder público, e receber incentivos fiscais ou creditícios. O momento em que estamos nos remete a muitos cuidados e cautelas principalmente no acesso mais simplificado à população. Houve um baque significativo nos nosso trabalho então isso reflete. Meu questionamento é de que muito provavelmente essas justificativas [para os atrasos das revisões] já existiam antes da pandemia. Raros os municípios que observaram esse prazo. Muitos deles dificilmente cumpriram com esse prazo, então quais são as justificativas anteriores à pandemia para justificar a inobservâncias?”, indagou. 

A cidade de Lauro de Freitas, na Região Metropolitana de Salvador (RMS), atualizou os instrumentos legais no ano de 2018. Mesmo período em que Feira de Santana, no Portal do Sertão, atualizou o PDDU e a Louos. De acordo com o secretário de Planejamento de Feira, Carlos Brito explica que mesmo assim uma atualização está sendo feita. “Em função da própria dinâmica do município que tem crescido muito rápido apesar da crise”, disse. 

O município com atualização mais recente, tanto do PDDU, quanto da Louos, é Barreiras, na Bacia do Rio Grande, que reviu em 2019 os documentos junto à população. Aspecto de extrema relevância, como pontua a especialista. “É essencial a participação popular. Se este critério não for cumprido, a elaboração do PDDU deixa de existir. Daí será necessário apresentar um novo projeto passando por todo esse processo para que o plano entre em vigor dentro do que se espera. É o que chamamos de gestão participativa”, explicou. | BN.


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