Parceria entre cartório e Prefeitura de Conquista pode ser alvo de investigação

A foto oficial da parceria, tendo ao centro a vice-prefeita Irma Lemos e Carlos Bramont, foi retirada do site da Prefeitura

Imagem: Site da PMVC/divulgação

Jussara Novaes (Sudoeste Digital) – A parceria da Prefeitura de Vitória da Conquista, a
509 km de Salvador, com o
Cartório do 1º Ofício de Registro de Imóveis e Hipotecas pode ser objeto de investigação por envolver processo
de emissão de escrituras do programa de Regularização Fundiária dos loteamentos
municipais tendo como responsável o chefe do cartório, Antônio Carlos Bramont,
preso preventivamente nessa terça-feira, 3, na Operação Factum, da Polícia
Federal.


Ele
continua preso.
De acordo com os investigadores, ele
chefiava um esquema de corrupção envolvendo serviços prestados pelo cartório. A
defesa dele não se pronunciou até o momento.
A
parceria entre Prefeitura e cartório foi confirmada em 7 de março deste, com
aval da Diretoria de Habitação de Interesse Social, no gabinete da Secretaria
de Desenvolvimento Social, com a presença de Carlos Bramont e da vice-prefeita
e Secretária de Desenvolvimento Social.
Com a repercussão
nacional da Operação da PF, a foto oficial do encontro no site da Prefeitura
foi substituída pelo brasão do município. O site foi atualizado em 4 de Abril de 2018 as 10:27:02 (veja abaixo)

No
intuito de saber se a parceria também faz parte do rol de investigações em
curso e se há indícios de ilegalidade, uma vez que foram constatadas
irregularidades no cartório, a reportagem do Sudoeste Digital tentou falar, na
tarde desta quarta-feira, 4, com o delegado-chefe da PF em Vitória da Conquista
e
 coordenador da operação, Jorge Vinícius Gobira. Ele não atendeu a equipe,
informando, por meio da atendente,  estar
em reunião. 


Em
coletiva de imprensa, na manhã dessa terça-feira, imediatamente após a operação,
o delegado Gobira, explicou que Carlos
Bramont cobrava uma “taxa de agilização” para realizar atos
cartorários. O valor cobrado variava, mas foram constatados pagamentos entre R$
100 e R$ 800.



A polícia ainda investiga o envolvimento no esquema de construtoras que atuam na região, que não tiveram nomes divulgados. A reportagem flagrou, na manhã de terça-feira, dois policiais federais (um homem e uma mulher) adentrando o escritório da MRV nas proximidades do Fórum. A empresa não se posicionou.
A PF recolheu documentos, arma, dinheiro e cheques na casa de Bramont

Imagem: Redes sociais
Durante a operação, os policiais federais apreenderam, em
espécie, R$ 71.780 e US$ 2.700, além de R$ 390 mil em cheques na casa do
suspeito. O valor seria oriundo do esquema de corrupção. De acordo com o
delegado, a prática era realizada há 15 anos.



Em nota o
 Tribunal de Justiça da Bahia
informou que o chefe do Cartório do Primeiro Ofício de Registro de Imóveis e
Hipotecas de Vitória da Conquista, Antônio Carlos de Jesus Bramont, possui um
histórico de sucessivos procedimentos disciplinares e que a corregedoria geral
da justiça já decidiu pela demissão do acusado mas ele tem utilizado recursos
jurídicos para recorrer ao Superior Tribunal de Justiça e manter-se no cargo.

“AGILIZAÇÃO”
“Esta
parceria entre o Governo Municipal e o Cartório tem agilizado todo processo de
tramitação dos documentos”, enalteceu, à época, Carlos Bramont.
A
Prefeitura não informou a contrapartida da “agilização” na parceria com o
cartório, uma vez que o processo de emissão de escrituras costumava ser
demorado, sendo acelerado apenas com o “pagamento de vantagem
indevida”, conforme restou apurado em investigação da PF por meio de
flagrante em vídeo.

Uma
fonte da Prefeitura, que se manifestou anonimamente, acredita que a
contrapartida se deu por meio de troca de favores. “Em 31 de março de 2017,
Yvonne Bezerra Bramont, filha de Carlos Bramont, foi nomeada para cargo de
confiança na Prefeitura”, contou.
A
reportagem apurou que ela chegou a auxiliar o pai nos serviços de cartório e
foi alvo de correição cartorial em 2015. Desde então, não mais atuava no Fórum.
A
irmã dela, Amanda Bezerra Bramont, que também ocupa cargo de confiança na
Prefeitura, foi presa na Operação da PF.
Apontada
pela PF como “braço direito do pai no cartório” – Amanda e outras duas pessoas
igualmente alcançadas (a prima dela, Ana Caroline Bezerra de Castro e a
despachante Maria Aparecida de Souza Pereira) – prestaram depoimento e já foram
liberadas.



O Tribunal Regional Federal da Primeira Região, subseção de Vitória da Conquista, deferiu diversas medidas cautelares para os acusados investigados pela Operação Factum no Cartório do 1º Ofício de Registro de Imóveis e Hipotecas do município.
A Autoridade Policial informou que as investigadas presas: Anna Caroline Bezerra de Castro e Maria Aparecida de Souza Pereira foram interrogadas e demonstraram interesse em colaborar com as investigações, não existindo a necessidade da custódia para ambas.
Já a acusada Amanda Bezerra Bramont não quis colaborar com as investigações, porém por estar grávida (fato confirmado através de atestado médico) e com contrações esparsas, ela foi encaminhada para o Hospital Unimec para passar por um acompanhamento médico.
Sendo assim, o MPF concedeu liberdade provisória para Anna Caroline e Amanda Bramont, com imposição de prisão domiciliar, proibição de contato com os outros investigados e o pagamento de 50 salários mínimos para cada uma. Também foi concedida a acusada Maria Aparecida a liberdade provisória mediante compromisso de recolhimento para sua residência no período noturno e nos dias de folga, além da proibição de contato com os outros envolvidos com o caso.

A
Prefeitura não atendeu a nossa reportagem, nem respondeu à solicitação feita
por E-mail sobre a atividade de Amanda.
ESCRITURA

O nome da operação é referência a um dos significados da
expressão “factum”, que, em latim, pode ser “escritura”, já que os crimes de
corrupção ora investigados eram praticados sobretudo para agilizar o registro
de escrituras.
FACILITAR
Na
oportunidade da celebração do ato com o cartório, Irma Lemos falou ao site
oficial da Prefeitura, celebrando a parceria. “Nosso objetivo é entregar, ainda
no mês de maio, ao menos 100 escrituras dos processos que já estão em
andamento. E esta parceria com o cartório irá facilitar a elaboração das
escrituras”.
Durante
a reunião, que também contou com a presença do procurador municipal Cristiano
Ferreira e equipe da coordenação de Habitação, o técnico de informática,
Ricardo Aguiar, apresentou o programa Habitar, que foi criado para gerar, de
forma automática, o Termo de Concessão de Direito Real de Uso (CDRU) e
escritura do imóvel em nome do proprietário.
Em
nota no site oficial, foi destacado que “o programa tem auxiliado tanto a
Prefeitura, quanto o cartório na geração dos documentos necessários para
conclusão da regularização fundiária dos loteamentos municipais Vila América,
Recanto das Águas, Henriqueta Prates e Alto da Colina”.
No
texto, destaca-se uma “provocação” à gestão anterior. (…) O
programa de regularização beneficiará muitas famílias que moram em loteamentos
municipais, a exemplo do Henriqueta Prates que foi criado pela prefeitura em
1985 e, até os dias atuais, os moradores não contam com as escrituras de suas
casas.(…)
“No
Henriqueta a Fapes, empresa contratada para levantamento da documentação,
identificou 472 famílias que receberão as escrituras ao final do processo.
Estamos trabalhando muito para que as famílias sejam contempladas o quanto
antes possível, e este alinhamento com o cartório de registro de imóveis é
fundamental nessa empreitada.”, explicou, também no ato, Wal Cordeiro, diretor
de Habitação. Até o momento nenhum dos citados, nem a Prefeitura, se manifestou
a respeito.
SAIBA
MAIS SOBRE A OPERAÇÃO
Durante a operação,
policiais federais realizaram buscas em oito endereços, inclusive em um imóvel
que pertence a Antônio Carlos em Salvador. Nas buscas, os policiais descobriram
que ele mantinha um “cartório paralelo” dentro de casa, o que é
considerado irregular.
“Ele realizava
boa parte do serviço dentro de casa com sua filha. Encontramos lá uma
impressora com papel timbrado, o que não é permitido pelo Tribunal de
Justiça”, detalhou o delegado, acrescentando que foi apreendido um
papagaio e um acessório de um rifle que o suspeito importou do Paraguai, o que
configura crime ambiental e tráfico internacional de arma de fogo,
respectivamente.
Ele também vai
responder por corrupção passiva, desobediência, uso de documento, falsidade
ideológica e posse ilegal de arma.
Investigação
O esquema envolvendo o
cartório foi descoberto por conta de uma investigação iniciada em 2016 para
apurar o crime de desobediência. “As investigações se iniciaram a partir
do reiterado descumprimento de ordens judiciais por meio do titular do
cartório. Chegaram várias decisões da Justiça Federal e do Trabalho e o titular
não as respondia ou demorava muito para responder. Então, o inquérito foi
aberto por desobediência, que é um crime com uma pena muito reduzida. Mas, com
o andamento das investigações, acabou se constatando que naquele cartório havia
um ambiente favorável à corrupção”.
Sobre os crimes
praticados inicialmente, o delegado explicou que o cartório, que é responsável
pelo registro da metade dos imóveis da cidade, deixou de cumprir sete pedidos
da justiça, que solicitava o registro de penhora de imóveis. A situação
prejudicou o andamento dos processos na Justiça Federal e do Trabalho, mas
também houve irregularidades envolvendo solicitações da Caixa Econômica Federal
e do INSS.
Por conta dessas
situações e dos reiterados problemas com servidores do TJ-BA, que eram enviados
para trabalhar no cartório, o titular do órgão foi alvo de três procedimentos
disciplinares, mas que não culminaram na saída dele do cartório. Contudo, essas
ocorrências motivaram o início da investigação pela PF.
Além das prisões,
também foi expedido mandado determinando o afastamento dos presos das funções públicas.
Com isso, Antônio Carlos fica afastado do cartório.



Associação de titulares de cartórios sobre Caso Bramont: repúdio à fraude, corrupção ou má-fé

(Por Fábio Sena) – A Associação dos Titulares de Cartórios do Estado da Bahia – ATC/BA manifestou-se, nesta terça-feira (3) sobre a a atuação conjunta do Ministério Público Federal (MPF) em Vitória da Conquista e da Polícia Federal, que desarticularam uma organização criminosa formada por integrantes do cartório 1º Ofício de Registro de Imóveis e Hipotecas do município. Entre outros, foi preso o oficial titular do cartório, Antonio Carlos de Jesus Bramont.
Na nota, a associação afirma que ser “indispensável” a apuração de fatos envolvendo corrupção “supostamente cometida no âmbito de serventia extrajudicial atualmente ocupada por servidor do Tribunal de Justiça do Estado da Bahia, que somente está ocupando a função de Oficial de Registro por força de decisão judicial, uma vez que não prestou concurso de provas e títulos para a outorga de delegação, como determina o art. 236, da Constituição Federal”.
De acordo com as investigações, iniciadas em 2016, a organização criminosa é suspeita dos crimes de corrupção, desobediência, prevaricação, uso de documento falso e estelionato. Dentre outras ilegalidades, no Cartório era frequente o pagamento de valores indevidos em troca de agilidade na prestação de serviços que deveriam ser executados de ofício. Além disso, o titular do ofício descumpriu decisões em processos na Justiça Federal e na Justiça do Trabalho.
Abaixo, na íntegra, a nota da associação:
A Associação dos Titulares de Cartórios do Estado da Bahia – ATC/BA, vem, por intermédio da presente NOTA, esclarecer à população baiana que a operação FACTUM deflagrada pela Polícia Federal e o Ministério Público, que tem como alvo o 1º Ofício de Registro de Imóveis da Comarca de Vitória da Conquista, cuida da indispensável apuração de fatos envolvendo corrupção supostamente cometida no âmbito de serventia extrajudicial atualmente ocupada por servidor do Tribunal de Justiça do Estado da Bahia, que somente está ocupando a função de Oficial de Registro por força de decisão judicial, uma vez que não prestou concurso de provas e títulos para a outorga de delegação, como determina o art. 236, da Constituição Federal.
A ATC-BA, como legítima representante dos delegatários de serventias extrajudiciais do Estado da Bahia aprovados no primeiro e único concurso público para a delegação de notas e registros, realizado em 2013, vem a público REPUDIAR, de forma veemente, qualquer atitude de fraude, corrupção ou má-fé praticada no âmbito dos cartórios baianos, o que atenta contra a segurança jurídica e a fé-pública deferida pelo Estado e esperada por todos os usuários dos serviços extrajudiciais.
Deste modo, a ATC-BA reafirma o compromisso com a população baiana quanto à eficiência, publicidade, autenticidade, segurança e eficácia dos atos e negócios jurídicos praticados nos Cartórios da Bahia.

Bahia, 3 de Abril de 2018.
A DIRETORIA


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