Linha imaginária em Minas separa Bahia que fala “uai!

Como pode uma pessoa estar fisicamente em dois lugares ao mesmo tempo? Para a comerciante Claudinéia Almeida isso é completamente possível, mas, somente graças a uma das inúmeras peculiaridades em alguns dos 13 municípios do sudoeste baiano que estão na divisa com o Estado de Minas Gerais.

No caso da comerciante, residente no distrito de Vila Bahia, em Encruzilhada(636 km de Salvador), basta apenas colocar um pé numa calçada e outro na seguinte para estar com o corpo, ao mesmo tempo, em solos baiano e mineiro. 

“Moleza, uai!”.

O que parece um fenômeno nada mais é do que uma estranha divisão territorial marcada por uma fileira de calçamento para separar o município de MataVerde (MG) de Encruzilhada (BA). Uma placa elevada, com o nome da cidade mineira informa aos visitantes que ali começa o outro Estado. E não para por aí. Embora residam na Bahia, os cerca de 3 mil moradores do distrito são atendidos por Minas Gerais nas áreas de segurança pública, educação, saúde, telefonia móvel 3G e fixa, abastecimento de água e de energia elétrica. A contrapartida é revertida em forma de impostos, regiamente pagos pelos “baianeiros”. 

Difícil encontrar quem reclame da invasão mineira.

Um exemplo está na própria comerciante, que matriculou dois, dos três filhos, em escolas de Mata Verde. “Os dois estão bem adiantados porque o ensino em Minas é reforçado, mas o que estuda na Bahia está muito atrasado”, relata.
Baiana de nascimento, mas mineira de “consideração”, Claudinéia mistura sotaques e ri das histórias envolvendo os dois estados a partir da região onde vive, a 30 km da sede de Encruzilhada. “Tem muito sangue baiano morando em Mata Verde porque, como a maternidade mais próxima fica a 130km, em Vitória da Conquista, as crianças nascem lá e voltam para Minas”.

A convivência pacífica não dá lugar a preconceito, nem diferenças culturais. “A gente mistura comida baiana com comida mineira, mas tudo aqui depende mesmo é de Mata Verde. Claro que a gente contribui com eles porque até a eleição de lá quem ajuda a decidir somos nós”, deixa escapar, referindo-se aos mais de 600 eleitores que lotam as seções da cidade mineira de 7.458 habitantes. 

“Posso até me dar ao luxo de trabalhar em dois estados e cumprir sem problemas a minha jornada”, finaliza, ao tempo em que fecha o pequeno restaurante na Bahia e se dirige para Mata Verde, na mesma rua, para abrir a casa lotérica amenos de cinco metros de casa.

Horário de verão 

Nem tudo é tranqüilidade na pacata relação dos baianeiros de Mata Verde e Encruzilhada.
A chegada do horário de verão, por exemplo, é um dos maiores entraves para ambas as localidades. Como a Bahia não adota o sistema, trabalhadores que cumprem jornada dupla, como professores e profissionais liberais, se esforçam para se manter alinhados.
Nem sempre é possível. 

“Conheço uma professora que leciona em Encruzilhada, a 30 quilômetros daqui, que fica quase louca quando chega o horário de verão porque ela também atende a escolas em Mata Verde e só chega atrasada”, relata o marceneiro Elicésar Lima de Oliveira.

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