JUSTIÇA – Cadeia “5 estrelas” ou direitos fundamentais?

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Vitor Guglinski* – Como tem sido normal ocorrer ultimamente, o discurso da vingança e do ódio tem tomado conta dos debates envolvendo o Projeto de Lei nº 2230/2011, de autoria do deputado Domingos Dutra, que cria o chamado Estatuto Penitenciário Nacional.

Como dito, a proposta soa como desafiadora àqueles que veem no preso nada mais do que uma “coisa” que merece apodrecer nas masmorras nacionais. Melhor ainda se a pena for aplicada com requintes de crueldade, da forma mais sofrida possível.

Pois bem, um dos objetivos da pena privativa de liberdade é retribuir à sociedade o mal praticado (caráter retributivo da pena).

Quanto a esse aspecto retributivo, do ponto de vista pedagógico, como se retribui um mal?

Penso, salvo melhor juízo, que seja praticando um bem. Está correto?

Sendo assim, como desenvolver no detento a ideia de prática do bem, se o ambiente penitenciário oferece a ele justamente o contrário? Isto é, nossas penitenciárias não informam ao preso outra coisa que não a mensagem de que a sociedade está pouco se lixando pra sua recuperação. A partir do momento em que a pessoa comete um crime, na visão de nossa sociedade vingativa automaticamente se torna um pária; um ser indesejado, que deve ser eliminado do convívio social, como se aqueles que desejam seu sofrimento jamais tivessem cometido algum pecado. Santa hipocrisia!

Prisão serve para que, momentaneamente, o criminoso seja afastado do convívio social, já que demonstrou, no momento em que delinquiu, um desafino com as regras do contrato social. Em momento algum nossa Constituição ou a legislação criminal postulam, afirmam ou sugerem que o preso mereça tratamento semelhante ao dado a um animal selvagem.

Consoante o senso comum, sustenta-se que não se deve dar ao preso a chance de se recuperar enquanto pessoa. E isso vem de uma sociedade que pensa (com alto teor de equívoco) que não é crime baixar músicas, filmes e livros na internet e comprar mídias e outros produtos pirateados; que é tolerável enganar a Receita Federal no momento de declarar o imposto de renda ou dar aquele “migué” no Leão no momento de passar as compras feitas no exterior sem declarar e pagar o imposto devido; que não é antiético furar filas; que é da maior esperteza receber o troco a maior e ficar calado…

Então, tendo em vista que a sociedade brasileira sustenta tal mentalidade, é até coerente desejar que o preso sofra o máximo possível na cadeia. Isso se afina com a mentalidade de que “pequenos deslizes” são toleráveis e socialmente adequados. Nessa ordem de ideias, não se deve ficar espantado com o mal desejado ao criminoso.

Contudo, que a sociedade brasileira tenha pelo menos um pouco de sensatez, e deixe de sonhar em um dia ser Suécia, Áustria, Dinamarca etc., pois lá – no mundo civilizado – o preso tem tudo isso que aqueles que são contrários à nobre proposta do deputado Domingos Dutra tacham de “mordomias” ou “cinco estrelas”.

Banho quente, aparelhos para exercícios físicos, produtos de higiene pessoal, preservativos etc. São, antes, expressão de direitos arrolados na Constituição da República – Carta que não faz qualquer ressalva sobre quais são os destinatários dos direitos fundamentais por ela consagrados.

Advogado. Pós-graduado com especialização em Direito do Consumidor. Membro do Instituto Brasileiro de Política e Direito do Consumidor (BRASILCON). Ex-assessor jurídico da 2ª Vara Cível de Juiz de Fora (MG). Autor colaborador da obra Código de Defesa do Consumidor: Doutrina e Jurisprudência para Utilização Profissional (Coleção Uso Profissional – Editora Juspodivn). Coautor da obra internacional Temas Actuales de Derecho del Consumidor (editora Normas Jurídicas – Peru). Coautor da obra Dano Temporal: O Tempo como Valor Jurídico (editora Empório do Direito). Colaborador da Rádio Justiça do STF. Colaborador de diversos periódicos jurídicos.


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