INVESTIGAÇÃO – “Franquia” clandestina de linhas de van chega a R$40 mil em Conquista

Van clandestina tenta ultrapassar ônibus para chegar primeiro aos passageiros e atropela motociclista na Praça do Gil. Imagem: Redes sociais/9 de abril de 2018

Além dos riscos de acidentes com vítimas – como o registrado este
mês, na Praça do Gil, a falta de repressão ao transporte clandestino fez surgir
um comércio ilegal e criminoso, que envolve milícias especializadas em criar
“franquias” de linhas para vans com preço em torno de R$40 mil
cada. 


No acidente citado, dia 9 deste mês, um motociclista sofreu lesões ao ser
atropelado por uma van clandestina, em alta velocidade. O vanzeiro tentava
chegar antes que o ônibus da Viação Vitória para apanhar passageiros.
“Depois de me atropelar ele fugiu sem prestar socorro, mas já localizamos
o veículo”, contou a vítima.

A van, de placa CGS-4129, é a mesma flagrada
dias depois, no Ceasa
, pela equipe do Sudoeste Digital, conduzindo
passageiros e trafegando com a porta lateral aberta. O auxiliar do motorista
agrediu verbalmente a equipe e outro vanzeiro tentou se apossar do equipamento
fotográfico. 

ITINERÁRIOS RENTÁVEIS

O faturamento diário pode chegar a R$600,00, segundo um
ex-vanzeiro, que repassou sua linha para investir num comércio formal.

“Eu era frentista num posto de combustível, mas resolvi pedir as contas e
colocar uma van para rodar. Garanto que estava faturando muito mais com ela,
mas com a chegada de concorrência e gente perigosa, envolvido com crimes
pesados, fiquei com medo e vendi a linha por R$40 mil”, relata a fonte,
que pede anonimato. “Bateu arrependimento, mas era o melhor a fazer, senão
estaria morto a essa altura”.


O temor do ex-vanzeiro faz sentido, principalmente diante de denúncias de
grupos organizados, interessados em itinerários rentáveis e na valorização das
linhas, exploradas por mais de 200 veículos, incluindo carros de passeio,
superando a mais de 1.300. O levantamento é do Sindicato dos Rodoviários (Sindicato dos Trabalhadores nas Empresas de Transporte
Rodoviário, Passageiros, Cargas, Fretamento, Turismo e Pessoal de Apoio de
Vitória da Conquista – SINTRAVC)

O Sindicato dos Rodoviários, embora nãos seja parte diretamente interessada,
também destaca a situação envolvendo as “franquias”. Por meio do seu
presidente, Álvaro Souza. “O sindicato tem conhecimento de ‘ouvi
falar’ que existem pessoas vendendo. Cabe a Prefeitura fiscalizar e saber se
isso procede, porque se estiver acontecendo é um crime. O sistema pertence à
Prefeitura”. 

Apesar de a informação não ter sido confirmada oficialmente, já que o negócio é
feito na clandestinidade, sem emissão de recibo ou qualquer outro documento,
existe uma investigação interna em curso, com a colaboração de delatores do
sistema ligados a cooperativas. A lucratividade ilícita está ligada à perda de
receita das empresas de ônibus.

“Como exemplo a gente cita a linha “Lagoa das Flores”, operada
pela Viação Vitória. Essa linha tinha 700 passageiros/dia. Com esse novo
sistema por conta das vans, a empresa de ônibus viu cair para apenas 100
passageiros/dia, sendo que a maioria paga meia, como estudantes, ou tem
gratuidade, como idoso, militar, deficiente”. A arrecadação diária da
empresa gira em torno de R$45,00 a R$50,00.

CRESCIMENTO DOS CLANDESTINOS

Pesquisas internas do Sindicato dos Rodoviários confirmam as denúncias
apresentadas pelo Sudoeste Digital, sobre o elevado número de veículos
clandestinos transportando passageiros. “Com o relatório de amostragem que
tivemos acesso, chegamos a um número que ultrapassa a 500 vans e 800 carros
particulares prestando serviço de transporte em nossa cidade”, sustenta o
presidente da entidade, em entrevista gravada.

“O
sindicato vê com muita preocupação o crescimento do transporte de vans e de
carros particulares, uma vez que isso está onerando e muito as duas operadoras
que prestam serviço na cidade, que são a Cidade Verde e Viação Vitória”,
enfatiza Álvaro. 

Ele destaca que o sindicato está cobrando do governo municipal o início do
processo licitatório que irá definir qual o sistema de vans que estará operando
e iniciar imediatamente a fiscalização daqueles que estão irregulares.
“Mas, se for para essas vans atuarem
nas mesmas linhas aonde já atuam os ônibus, infelizmente será um caos e um
prejuízo muito grande para as duas operadores”. 

OFÍCIO
DO CONSEG

O Conselho
Comunitário de Segurança Pública da
Indústria, Comércio e Entidades Afins de Vitória da Conquista (Conseg) 
também
demonstra preocupação com o avanço dos ilegais. Isso ficou evidente este
mês, quando o órgão tornou público um
documento, que havia sido encaminhado à Prefeitura em 19 de março deste ano. 

Nele, o
órgão requer “atenção imediata das autoridades públicas competentes com
relação ao atual momento que o transporte irregular de passageiros tem se
expandido pela cidade”, o órgão faz uma denúncia grave. “A formação
de grupos que já disputam áreas de acesso, realizando cobrança de “pedágios”
para circulação em alguns bairros”.

Ainda no
ofício, o Conseg destaca que a falta de regulamentação “facilita a ação de
traficantes e demais criminosos” pois por falta de padronização muitos veículos
possuem películas escuras aplicadas em seus vidros.

Além dos bairros da zona
Oeste, como Brasil, Kadija, Santa Cruz, Patagônia e conjuntos habitacionais, as
vans clandestinas circulam sem fiscalização por mais populosos das zonas Leste
e Sul, a exemplo de Guarani, Nossa Senhora Aparecida, Vila América e Candeias
(ao longo da avenida até a Uesb).

No mesmo documento, o
Conselho sustenta que o transporte feito pelas vans acontece sem qualquer
fiscalização, sem qualquer regulamentação, sem nenhum tipo de controle e
segurança e “expõe os seus usuários e demais cidadãos a riscos”.

O Ofício diz ainda que “o
transporte de passageiros pelas vans, nos moldes atuais geram prejuízos aos
cofres públicos, “vez que nosso município não vem arrecadando, quer em
razão da falta de regulamentação e controle, quer pela ausência de
fiscalização”, e que “o transporte por meio de tais veículos é realizado de
forma desordenada, clandestina e ilegal”.

Por fim, a entidade
menciona a “crise enfrentada pelas duas empresas de ônibus licitadas,
“principalmente pela diminuição de passageiros para as vans e com consequências
ainda maiores nos direitos sociais com a perda de linhas de ônibus, cujas
maiores prejudicados são as pessoas que tem os serviços de gratuidade, (idosos
e portadores necessidades especiais) e meia passagem para os estudantes, além
da redução das receitas tributárias e direitos trabalhistas que o poder público
deve tratar de forma vinculante”.

PREFEITO REAGE

O prefeito Herzem Gusmão
(MDB) usou os microfones da Rádio Brasil FM, por meio do programa Resenha
Geral, para se manifestar a respeito do caos no transporte público
conquistense. Em tom de discurso, prometeu lançar edital para licitação do
Transporte Coletivo Alternativo por meio de vans. Em sua fala, veiculada na
última sexta-feira, 19, Gusmão assegurou estar licitando 160 vans, das quais 80
ficariam no cadastro de reserva. A licitação deve ser publicada em 2 de maio.
Embora sem apresentar
dados que atestem quadro satisfatório sobre a problemática no sistema, o
prefeito sustentou o contrário. que “as pesquisas mostram que a cidade de
Vitória da Conquista não apresenta o transporte coletivo como o problema que
mais afeta a vida do conquistense. Essa ação é uma das promessas da campana das
Eleições 2016, quando Herzem ganhou apoio dos vanzeiros. 

VANZEIROS INSATISFEITOS

O representante da
Associação do Transporte Alternativo de Vitória da Conquista (ATRAVIC), Alcides Meira, declarou ao
Blog do Anderson que os membros da entidade
 “não estão
satisfeitos com as últimas notícias sobre o lançamento do Edital de Licitação
do Transporte Alternativo”. Segundo Meira, a forma como foi apresentado
o processo vai prejudicar a categoria. 

Sobre o atendimento a
usuários em caso de acidente com vítimas, Meira garante que a associação irá
contratar seguro com uma empresa do setor.


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