Esse navio é da necropolítica
legiões de homens e mulheres negras
e outras quase negras na rua a aglomerar
designados para morrer
É revoltante de ver
de decreto em decreto
o trabalhador vai pra linha da morte
no comércio ou no mercado informal
é a classe econômica baixa
escolhida para morrer
Negras mulheres nas ruas…
Magras crianças, cujas bocas sem máscaras
Expostas à sanha dos ricos
sem máscaras para morrer
Todo aglomeração tem um pouco de navio negreiro!
Todo aglomeração tem um pouco de navio negreiro!
Estamos em pleno mar
um sonho dantesco… o tombadilho,
que das luzernas avermelha o brilho
seu sangue como sacrifício
Um chão pra morrer vermelho
Um chão pra morrer vermelho
um chão vermelho para morrer
Outro, que de martírios embrutece,
esmagado no ônibus, geme e ri de banzo
vivendo de decreto em decreto
o trabalhador pode morrer
sem abraço ao caixão
sem flores para enterrar
designado e escolhido
só te resta morrer.
Davino Nascimento, professor, escritor e poeta.