O atual prefeito de Itabuna, Fernando Gomes (PTC), candidato à reeleição pela Coligação “Deixa o Homem Trabalhar”, teve seu pedido de registro impugnado na tarde dessa quinta-feira, 1º, pela Coligação “Itabuna tem Jeito”, que tem o médico Dr. Mangabeira (PDT) como cabeça de chapa.
A petição, disponível na página de processo virtual do Tribunal Superior Eleitoral, alega que o prefeito se encontra inelegível por ter sofrido uma condenação por ato doloso de improbidade oriunda da Justiça Federal de Itabuna e mantida pelo Tribunal Regional Federal da Primeira Região, cuja relatoria esteve a cargo do Desembargador Ney Bello.
Segundo consta da impugnação “a condenação por ato doloso de improbidade que foi irrogada ao ora impugnado é daquelas que se enquadra perfeitamente no art. 1o, inciso I, alínea “l”, da LC n. 64/90, razão pela qual, também por esse motivo, deve ser indeferido o seu pedido de registro de candidatura ao honroso cargo de prefeito de Itabuna”.
Cinco rejeições de contas
A ação de impugnação movida pela coligação de Dr. Mangabeira sustenta ainda que o atual chefe do Executivo de Itabuna se encontra inelegível por ter sofrido quatro rejeições de contas pelo Tribunal de Contas da União – TCU e uma pelo Tribunal de Contas do Estado – TCE, todas por irregularidades insanáveis que constituem atos dolosos de improbidade administrativa.
A petição, a qual A TARDE teve acesso com exclusividade, é subscrita pelos advogados Michel Soares Reis e Paulo de Tarso Brito Silva Peixoto. Ela diz que “a coligação ora autora [pede] seja JULGADA PROCEDENTE A PRESENTE IMPUGNAÇÃO, de modo a INDEFERIR-SE O PEDIDO DE REGISTRO formulado por Fernando Gomes Oliveira nos autos do RRC n.º 0600237- 53.2020.6.05.0028 e, consequentemente do DRAP n. 0600235-83.2020.6.05.0028”.
Enriquecimento ilícito de terceiros
Um dos argumentos da impugnação é a inelegibilidade prevista no art. 1º, inciso I, alínea “L” da Lei Complementar n.º 64/1990, com a redação dada pela Lei Complementar n.º 135/2010, tampem conhecida como lei da ficha limpa.
Os advogados sustentam que a sentença e o acórdão da Justiça Federal deixaram claro o enriquecimento ilícito da empresa beneficiada pela licitação que gerou a condenação. Eis o que diz a sentença do Juiz Federal Wilton Sobrinho da Silva, mantida integralmente pelo TRF1:
“Logo, afiguram-se irreparáveis as conclusões da fiscalização da CGU, no sentido da existência de irregularidades na aplicação de recursos do PETI/2008, uma vez que houve contratação direta, sem o prévio processo licitatório, bem como utilização de documentos falsos para aparentar regularidade de processos de pagamento.
(…)
Assim, parece-me que a conduta do gestor municipal, permitindo a realização do contrato sem procedimento licitatório, sendo o responsável pela utilização e fiscalização das verbas federais repassadas ao município, assim como a conduta da requerida Margone Gonçalves de Souza, sócia-administradora da empresa contratada, favorecida com os pagamentos dos valores, demonstra a prática de ato doloso de improbidade administrativa.
Após a análise individualizada de todas as condutas imputadas aos requeridos, tenho que com relação ao acionado Fernando Gomes Oliveira, ainda que não tenha restado cabalmente demonstrada a apropriação dos valores, é indene de dúvidas a sua consciência e vontade quanto às condutas empreendidas, já que era o gestor do município, responsável pela administração do erário municipal e pela realização de todos os atos administrativos da municipalidade, fato que se mostra suficiente para a sua responsabilização por ato de improbidade.
Com relação às requeridas INLUMIN PANIFICADORA LTDA e Margone Gonçalves de Souza, responsável pela administração da empresa, também é inequívoca a autoria, visto que aderiram ao contrato com o Poder Público, sem a realização do processo licitatório, bem como utilizaram notas fiscais inidôneas, demonstrando a má-fé na execução do contrato, coadunando-se tais condutas com a previsão contida no art. 3º da Lei nº 8.429/92, donde se extrai que responde por ato de improbidade aquele que, mesmo não sendo agente público, “induz ou concorre para a prática do ato de improbidade ou dele se beneficie sob qualquer forma direta ou indireta”.
Tais fatos evidenciam irregularidades na dinâmica de administração das receitas/despesas públicas. Esses dados, analisados em conjunto, mostram-se suficientemente comprobatórios da existência de perda de recursos públicos, o que impõe a devolução da quantia apontada pelo órgão ministerial.
(…)
É hialino que equívocos na definição das hipóteses de dispensa ou inexigibilidade de licitação podem ocorrer em qualquer gestão, muitas vezes caracterizando apenas o trabalho de um gestor inábil. No entanto, o caso em apreciação revela que sequer foi montado um processo administrativo para “dispensar” a licitação, o que revela o intuito de evitar qualquer fiscalização sobre as verbas irregularmente liberadas a terceiros.
Diga-se mais: os vícios apontados nas notas fiscais apresentadas à municipalidade eram facilmente detectáveis, uma vez que as datas de autorização de impressão dos documentos fiscais ou as autorizações para emissão de notas fiscais pertenciam a outras pessoas jurídicas. Deste modo, perfeitamente possível que o gestor público se comportasse de maneira diversa, evitando, assim, que a municipalidade sofresse um prejuízo com o pagamento irregular, cuja entrega dos itens referidos nos documentos fiscais tornara-se duvidosa, ante a falsidade documental neles estampada”.
A petição que pede a rejeição da candidatura de Fernando Gomes também se apega em um precedente do Tribunal Superior Eleitoral que deixou de fora da vida pública um cacique petista baiano, o ex-prefeito de Camaçari, Luiz Caetano, que se elegeu deputado federal em 2018 mas teve o registro cassado pela mais alta Corte Eleitoral do país. Na época, o TSE modificou sua antiga orientação e passou a ter diretriz no sentido de que o enriquecimento ilícito de terceiros também gera inelegibilidade. Diz o trecho da nova jurisprudência:
“(Recurso Ordinário nº 060098106 – SALVADOR – BA)
6. A pretendida leitura mais ampla da causa de inelegibilidade, para considerar exigível tão somente o dano ao erário ou o enriquecimento ilícito, contraria, a um só tempo, a decisão soberana do Poder Legislativo, que incluiu no projeto de lei a partícula aditiva, e a regra segundo a qual as causas restritivas de direitos fundamentais não devem ser objeto de analogia ou de interpretação extensiva.
7. A exigência de requisitos cumulativos para a incidência da inelegibilidade de que trata o art. 1º, I, l, da Lei Complementar 64/90 é compatível, do ponto de vista sistemático, com os arts. 14, § 9º, 37, § 4º, da Constituição Federal e com a Lei 8.429 /92, bem como com o princípio da proporcionalidade, notadamente quando se considera que a restrição ao jus honorum pode advir de decisão colegiada não transitada em julgado.
8. No caso, o Tribunal de Justiça da Bahia manteve sentença exarada em sede de ação de improbidade administrativa, na qual foi reconhecida a conduta ímproba descrita no art. 10, VIII, da Lei 8.429/92 – dispensa indevida de licitação – e impostas as seguintes sanções: a) ressarcimento integral da lesão ao erário, no valor de R$ 304.210,00, aos cofres do Município de Camaçari, com correção monetária desde a citação; b) suspensão dos direitos políticos pelo período de 5 anos; c) pagamento individual de multa civil equivalente ao valor da lesão ao erário, com correção monetária desde a citação; d) proibição de contratar com o Poder Público ou receber benefícios ou incentivos fiscais ou creditícios, direta ou indiretamente, ainda que por intermédio de pessoa jurídica da qual sejam sócios majoritários, pelo prazo de 5 anos.
9. Do exame da condenação proferida pela Justiça Comum, verifica-se que foi afastado expressamente o enriquecimento ilícito próprio, embora não conste manifestação categórica e específica no tocante ao acréscimo patrimonial de terceiros.
(…)
12. De acordo com os parâmetros fixados em caso semelhante, alusivo ao pleito de 2018, e em homenagem à regra da colegialidade, afigura-se presente o enriquecimento ilícito de terceiros, de modo que incide a causa de inelegibilidade descrita no art. 1º, I, l, da Lei Complementar 64/90, com a ressalva do entendimento do relator.
Recursos ordinários aos quais se dá provimento, para indeferir o registro de candidatura”.