A publicitária Sabrina Naila, 24 anos, era menina quando começou a fazer as romarias de Bom Jesus da Lapa, no Vale do São Francisco, onde mora. No começo, ainda uma criança, ela fazia o trajeto nos ombros dos pais, até que com o tempo começou a fazer o percurso com as próprias pernas. São dez dias de festa e segue até 6 de agosto, quando ocorre a procissão. Este ano a expectativa é receber 1 milhão de fiéis na cidade que tem 65 mil habitantes, ou seja, 15 vezes o número de moradores.
“Época de romaria a gente transborda por ver a cidade tão cheia. O clima é quente, de calor e de pessoas, e eu gosto muito. É a oportunidade de conhecer gente nova, de empreender e conseguir uma renda extra vendendo fitas, velas, terço e outras cosias. Eu faço essa romaria desde pequena e já separei o tênis, a blusa, o chapéu e o protetor solar que vou usar este ano”, contou Sabrina.
Ela disse que a festa mudou nas últimas décadas, que ficou maior em termos de público e em grandiosidade do evento. O secretário de Cultura e Turismo de Bom Jesus da Lapa, Hamilton Duda, explicou que cerca de 720 mil pessoas participaram dos dez dias de festa, em 2023, e que a expectativa é de que este ano o evento atraia 1 milhão de fiéis. Segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatísticas (IBGE), a população residente de Bom Jesus da Lapa é de 65.550 pessoas.
“Estamos com três espaços de eventos com apresentações culturais, padronizamos as barracas que ficam a beira do rio e requalificamos a Coroa do Rio São Francisco, o segundo o ponto turístico mais visitado da cidade, atrás apenas do santuário. O mercado municipal e a praça em frente à igreja também estão com atrações”, contou.
Ele afirma que 2 mil novos leitos de hospedagem foram abertos no último ano. Em Bom Jesus da Lapa são 7,5 mil vagas, todas estão ocupadas, mas é comum o público recorrer às cidades vizinhas de Riacho de Santana e Paratinga para se hospedar. Outra tática adotada é o aluguel dos imóveis. No bairro de Nova Brasília, por exemplo, o mais próximo do santuário, cerca de 80% dos moradores alugam a casa ou quartos.
O secretário contou que o planejamento da festa começa a ser discutido em janeiro e que os quatro meses de romaria, que começa com a procissão da Terra e das Águas, em julho, e termina com a de Nossa Senhora Aparecida, em outubro, são responsáveis por movimentar a economia da cidade o ano inteiro. A prefeitura não informou qual o investimento feito na festa, mas a reportagem apurou que alterna entre R$ 3 e 4 milhões
Grandiosidade
Atualmente, a romaria de Bom Jesus da Lapa é a terceira maior do país, atrás apenas de Aparecida (SP) e de Juazeiro (CE). O reitor do Santuário Bom Jesus da Lapa, padre Roque Silva, contou que a programação é de cinco missas por dia, terço da misericórdia e novenário. Serão 72 mil hóstias e no dia da romaria a expectativa é receber 400 mil devotos. A festa está completando 333 anos.
“Foi no ano de 1691 que Francisco de Mendonça Mar, um jovem português, saindo de Salvador, adentrou os sertões da Bahia e chegou até a gruta da Lapa trazendo consigo a imagem de Bom Jesus e outra de Nossa Senhora da Soledade e fez da gruta sua moradia e o oratório. Isso despertou a curiosidade da população. Mais tarde ele foi ordenado padre”, contou.
Ainda no século XVII, a devoção a Bom Jesus foi difundida pela igreja e a construção do santuário dentro de uma gruta atraiu a atenção de curiosos para a Bahia, o que impulsionou a festa. No dia da romaria, os romeiros usam um chapéu de palha para proteger do sol, forrado com tecido branco para simbolizar a paz e amarram uma fita verde em referência a esperança. O trajeto pelas ruas da cidade tem cerca de 2 km. Este ano, o tema da festa é ‘Bom Jesus modelo de oração, louvor a Deus e amizade’.
Durante os dez dias de festa, os principais visitantes são do norte de Minas Gerais, do interior da Bahia, de Goiás, do Espírito Santo, de Mato Grosso e do Distrito Federal, nessa ordem. No dia da romaria, os baianos lidaram a lista, principalmente aqueles que vivem no sul do estado. O Santuário de Bom Jesus da Lapa recebe, em média, 1,5 milhão de pessoas por ano.
Apesar da festa ser sinônimo de alegria, moradores pediram para fazer um alerta. Eles contaram que o rio está baixo, o que fez surgir bancos de areia em alguns trechos e que isso tem dado uma falsa sensação de segurança, mas o local tem muitos buracos submersos e visitantes estão se arriscando para se banhar. Pelo menos, dois episódios de afogamento já foram registrados nas últimas semanas. No dia 6 de abril, um adolescente de 16 anos morreu afogado e o amigo dele escapou por pouco.