Na manhã desta terça-feira, 26, a Câmara Municipal de Vitória da Conquista (CMVC) promoveu uma audiência pública para tratar da segurança alimentar da população conquistense e comemorar os 25 anos de fundação do Movimento de Pequenos Agricultores (MPA), e os 15 anos de fundação do Centro de Convivência e Desenvolvimento Agroecológico do Sudoeste da Bahia (Cedasb). A audiência é fruto da iniciativa dos mandatos dos vereadores Alexandres Xandó (PT) e Viviane Sampaio (PT).
Câmara não é preparada para receber o povo – O vereador Alexandre Xandó (PT) agradeceu a presença de todos na audiência. Ele ressaltou que estar na Câmara ainda é um desafio para os movimentos sociais, acostumados a estarem nas ruas. Para ele, os movimentos devem ocupar a Casa porque é onde são debatidos os projetos e ações que impactam diretamente na vida de todos, como o Projeto de Lei de Regularização Fundiária Rural. Segundo Xandó, sem a intervenção de seu mandato, possivelmente, os movimentos sociais nem ficariam sabendo. Com uma maior publicidade do projeto, a proposta poderá ser mais discutida.
Para o parlamentar, a Câmara não é um espaço preparado para receber o povo. Ele criticou a proibição de manifestações no plenário e lembrou que essa é uma forma legítima de participação popular. “O nosso lado é de respeito aos movimentos sociais”, disse. Xandó também frisou que os movimentos têm legitimidade e experiência para participação no debate público. “Essa Casa é do povo. Os movimentos sociais existem e resistem”, falou. O vereador lamentou a situação de fome e precariedade em que vivem parcelas da população brasileira e afirmou que “os famintos de hoje darão resposta” nas urnas.
Ataques à Agricultura Familiar – Uma das proponentes da discussão, a vereadora Viviane Sampaio (PT), apontou que o início do Governo Bolsonaro marcou também o começo de uma série de ataques à Agricultura Familiar. “Infelizmente, desde o início do Governo Bolsonaro a maioria das politicas públicas voltadas para a agricultura familiar foram quase extintas”, avaliou ela.
Diante do quadro atual, a parlamentar destacou a importância de a Câmara se debruçar sobre a temática da alimentação, uma vez que atualmente várias famílias enfrentam um quadro de insegurança alimentar. “A alimentação saudável é uma temática importante e urgente a ser debatida”, afirmou.
Ainda em seu pronunciamento, a vereadora lembrou que, diante da busca da Prefeitura Municipal de instituir a Taxa do Lixo no Município, é preciso discutir a destinação do lixo orgânico, destinando-o preferencialmente para a compostagem.
Fome voltou a assombrar população – Anderson Amaro, da coordenação nacional do MPA, falou da luta pelo direito à alimentação, para que os agricultores tivessem o direito de produzir seus alimentos e o povo da cidade também tenha acesso a esses produtos. Ele agradeceu o apoio ao movimento que permitiu uma trajetória longa. Amaro lembrou que o tema da segurança alimentar voltou à centralidade do debate diante das dificuldades impostas pela pandemia e crise econômica.
Para Amaro, “não podemos nos calar”, diante de situações como a que registrou pessoas famintas catando ossos. Ele também lembrou da luta para que 30% dos alimentos do PAA sejam da agricultura familiar. Amaro ressaltou a ação em Conquista que distribuiu alimentos para mais de 8 mil famílias. Ele pediu que a prefeitura apoie as pessoas em insegurança alimentar através do PAA.
Seca prejudicou produtores rurais – O coordenador municipal de fomento à Agricultura, Eduardo Barreto, apontou que o ano atípico aumentou as dificuldades dos pequenos agricultores. “Esse ano foi bem atípico, bem seco, bem quente e nós temos procurado dialogar para a gente buscar as soluções para àqueles que estão lá na ponta e para a agricultura familiar”, contou.
Ele reconheceu a importância da agricultura familiar. “A agricultura familiar tem uma importância social muito grande. Não dá pra falar em segurança alimentar sem falar no agricultor familiar”, disse ele, ressaltando a variedade de produção dos agricultores familiares. “Nós temos rodado muito o campo, escutando os agricultores, observando as demandas e levando algumas ações e propostas para a melhoria de vida de agricultores e agricultoras”, explicou ele, que elencou em seguida ações que estão sendo realizadas para fortalecer a agricultura familiar: aragem de até quatro tarefas de terra para pequenos produtores; instalação de dois campos de reprodução de manivas; estímulo à produção do umbu gigante; desenvolvimento do Programa Vamos Produzir.
Investimentos devem priorizar produção de alimentos – O membro do Conselho de Segurança Alimentar, Gilvan Souza, parabenizou o MPA pela luta que reconhece as necessidades da população. Para ele, é um trabalho que se diferencia de grandes investimentos como os realizados na soja para exportação em detrimento do estímulo à produção de alimentos, quando o país possui uma parcela significativa passando fome. Gilvan frisou as dificuldades trazidas pela pandemia que impactam a elaboração de um plano alimentar para Conquista.
Trabalho em busca de segurança alimentar escolar – O coordenador Municipal de Segurança Alimentar Escolar, Rodrigo Gigante, garantiu que o trabalho tem sido feito com o objetivo de oferecer alimentação de qualidade aos estudantes das escolas municipais. “A alimentação escolar vem se esforçando para oferecer alimentação de qualidade para os alunos”, disse ele.
O coordenador estimulou os produtores a se associarem, criar cooperativas para que possam produzir e vender para a Secretaria Municipal de Educação. Ele apontou que uma das dificuldades na compra de produtos produzidos em Vitória da Conquista é o volume de produção. “Nós pedimos 13 toneladas de café”, contou Gigante, exemplificando a quantidade de produtos adquiridos, o que faz com que seja necessário que os produtores se associem para que possam atender às demandas que são bastante grandes.
Sociedades industrializadas geram doenças – A professora da UFBA e representante do Projeto Raízes, Patrícia Baier, afirmou que o tema da soberania alimentar dialoga com outros campos como a saúde e os direitos do trabalhador. Ela parabenizou o mandato de Xandó e as entidades que organizaram a audiência. A professora apontou um elemento potencializador da situação de fome. “Nós estamos em plena emergência climática”, declarou. Para ela, a tendência é piorar e “tudo isso potencializa a fome”.
Patrícia defendeu soluções práticas para minimizar a situação de quem passa fome. Ela ainda ressaltou os benefícios da alimentação natural, sem agrotóxicos. “É o que traz mais saúde pra gente”, disse ao relatar que nesse tipo de cultura, ganham os agricultores e os consumidores. Patrício afirmou que “a natureza funciona na diversidade”, quando mais se diversifica o cultivo, mas benefícios a população recebe.
15 anos de apoio ao homem do campo – O representante do Centro de Convivência e Desenvolvimento Agroecológico do Sudoeste da Bahia (Cedasb), Josimar Antunes, destacou que o Centro atua em defesa dos interesses do homem do campo. “Ele nasceu de demandas de agricultores da nossa região por ter mais assistência técnica, assessoria para melhorar as suas condições de plantio, cultivo e criação de animais”, pontuou. “Seus membros em sua maioria são agricultores de vários municípios aqui da região”, detalhou ele, ressaltando que o Cedasb já chegou aos 15 anos, marcados pelo apoio aos produtores rurais. “São ações importantes que têm ajudado”, finalizou.
Gestão investe em ações de segurança alimentar – Karine Rodrígues, da Coordenação de Segurança Alimentar (SEMDES), frisou que Conquista está na décima edição do Programa de Aquisição de Alimentos (PAA), iniciativa do governo federal criada em 2003, que possui duas finalidades básicas: promover o acesso à alimentação e incentivar a agricultura familiar. Segundo Karine, em 2020 a Prefeitura Municipal, via PAA, adquiriu 185 toneladas de alimentos da agricultura familiar, tendo beneficiado 365 agricultores.
Ela ainda relatou outra estratégia da gestão municipal para atender grupos em situação de insegurança alimentar – as hortas comunitárias. Conquista possui quatro: Vila América, Recanto das Águas, kadija e Jardim Valéria. A produção é destinada à alimentação das famílias e também à geração de renda. A prefeitura, segundo Karine, acompanha as atividades com ações de limpeza no entorno das hortas, abastecimento com carros-pipa quando necessário, adubo, terra preta, caixas de água.
Atenção ao produtor rural – Moradora da Gameleira, Cíviles Lima parabenizou o vereador Xandó pela atenção destinada aos produtores rurais e reclamou da ausência de muitos parlamentares que são votados na Zona Rural, mas não defendem os interesses da população rural. “Muitos vereadores aparecem em nossos meios, ganham os votos e somem. Quem é eleito para ver nossas necessidades é o vereador”, apontou ela.
Cíviles destacou a importância de o homem do campo participar das discussões. “Nós precisamos disso”, disse ela, defendendo a ideia de que com mais participação da população rural fará com que recebam maior atenção do poder público.
Assistência Social passou por reestruturação – Clea Malta, diretora de Assistência Social (SEMDES), afirmou que a área passou por reformulação. Ela frisou que a gestão municipal tem se empenhado para garantir políticas públicas de seguridade social. Segundo Clea, os recursos para o PAA estão garantidos. Ela destacou o Restaurante Popular, que distribui mil refeições por dia. Neste ano, já foram distribuídas 163 mil refeiçoes, sendo 57 mil para a população vulnerável atendida por projetos da prefeitura na pandemia da Covid-19.
Clea explicou que mais da metade da população conquistense está no CadÚnico, o que permite que essas pessoas tenham acesso a políticas públicas. Ela ressaltou que, atualmente, existem 15 pontos, além de atendimento itinerante para a realização desse e outros cadastros e serviços. “Acabou a muvuca”, disse. Clea advertiu que mais 14 mil famílias estão com cadastro desatualizado. Ela também falou de ações de distribuição de alimentos como a que levou mais de 500 toneladas de comida às 32 comunidades quilombolas. A ação foi feita em parceria com a Fundação Palmares.
Governo Federal cria dificuldades – O vereador Ricardo Babão (PCdoB) lamentou que os produtores rurais estejam enfrentando um período de sérias dificuldades causadas pela desatenção do Governo Federal. “A gente vê que nesses últimos anos o homem do campo vem sofrendo, principalmente depois desse desgoverno que assumiu o Brasil. Ele não pensa no pequeno produtor, naquele que põe comida na mesa do povo brasileiro”, avaliou.
Ocupação luta por visibilidade – Claudiane Carneiro, do MTD e da Ocupação Beija-Flor, no Santa Marta, pediu apoio da Casa à iniciativa. Ela explicou que a ocupação existe há seis meses, num terreno que não possui “nenhum tipo de função social”. Além de moradia, os ocupantes têm desenvolvido cerca de 20 hortas comunitárias. Claudiane falou ainda da ideia de se criar uma escola e cozinha comunitárias. Também falou do apoio do vereador Xandó. Segundo Claudiane, com esse suporte a ocupação deixou de ser reprimida pela polícia.
Situação “inadmissível” – O vereador Chico Estrella (PTC) avaliou como “inadmissível” um país como o Brasil ainda ter problemas de insegurança alimentar. “É inadmissível que um país continental como o nosso, a sua população ainda sofra com a fome”, disse Estrella.
Líder do Governo, Chico disse que buscará garantir que as compras diretas da prefeitura junto ao produtor rural aconteçam. “Nós temos um programa na prefeitura criado, se não me falha a memória, no governo de Doutor Guilherme Menezes ou do professor Zé Raimundo, que era a compra direta de alimentos. Eu não sei como está ou se está implantado hoje na atual gestão. Me comprometo a levar à prefeita Sheila Lemos essa reivindicação”, prometeu Chico.