Uma troca de mensagens encontrada no celular da delegada Daniela dos Santos Rebelo Pinto – mulher do ex-delegado Marcos Cipriano, que foi transferido para o presídio de segurança máxima de Bangu 1 esta semana – mostra ela e outra delegada, Ana Lúcia da Costa Barros – planejando vingança contra o policial civil Marcelo Sequeira, que trabalha para o Grupo de Atuação Especial no Combate ao Crime Organizado do MP do Rio.
O celular de Daniela foi apreendido durante Operação Novo Egito, que investigou falsas operações policiais para favorecer Glaidson Acácio dos Santos, conhecido como Faraó dos Bitcoins. Já Ana Lúcia Costa chegou a ser afastada dos exercícios da função suspeita de consultar o sistema da Polícia Civil para ajudar alvos da quadrilha investigada na Operação Heron – contra agentes públicos aliados da maior milícia em atividade no estado.
Segundo os investigadores, as mensagens no celular de Daniela mostram que as delegadas planejaram reclamar com chefes de Polícia Civil e xingam o agente de “verme” e “x9”. “Polícial civil no Gaeco acabando com a gente, falando que é notório que polícia devolve máquinas para bicheiros”, escreve Daniela. “Tem x no Gaeco. Vergonha institucional. Pensar que tem polícia civil que se presta a isso”, diz Ana Lúcia em um trecho da conversa.
A intimidação de ao menos uma testemunha da investigação contra o ex-delegado Marcos Cripiano de Oliveira Mello foi uma das provas principais para que a Justiça determinasse a transferência dele para um presídio de segurança máxima, onde deverá ficar, efetivamente, sem acesso a celular e internet.
Cipriano foi preso em maio, na Operação Calígula, que mirou a exploração ilegal de jogos de azar pelo bicheiro Rogério Andrade. O ex-delegado foi flagrado usando o celular, de dentro da cela, para falar com a mulher, a também delegada Daniela dos Santos Rebelo Pinto.
De acordo com o Ministério Público, conversas travadas por Daniela com o marido e com outras duas delegadas revelam clara intenção de prejudicar as investigações “como é o caso de tramar junto à também delegada Ana Lúcia da Costa Barros retaliações ao Gaeco e às testemunhas”.
Para os promotores que investigam o caso, clara intimidação ocorreu durante audiência e instrução de julgamento do processo, em que um policial civil do Grupo de Atuação Especial de Combate ao Crime Organizado (Gaeco) seria ouvido na condição de testemunha. Daniela compareceu à audiência “acompanhada de diversos policiais civis que, inclusive, estavam em seu horário de expediente”.
Os promotores destacaram que “dentre estes policiais, alguns abandonara, o local sem se identificar, quando foi determinada esta identificação, ao passo que Daniela e outros agentes permaneceram na plateia para assistir ao ato”.
“Com a máxima vênia, a presença da esposa do réu, que é Delegada de Polícia, acompanhada injustificadamente de uma série de policiais civis armados à Audiência de Instrução, é causa efetiva de imposição de medo aos envolvidos neste processo, em especial à testemunhas, sobretudo quando mantido por estas mesmas testemunhas vínculo funcional com a PCERJ, onde Daniela e Marcos Cipriano sabidamente possuem grande influência e potencial para prejudicá-las”, destacaram os promotores no pedido de transferência de Cipriano para uma unidade prisional de segurança máxima.
Ao analisar o caso, o juiz Bruno Monteiro Rulière, da 1ª Vara Especializada em Organização Criminosa concordou com as argumentações da promotoria.
“Com efeito, os novos fatos e circunstâncias são excepcionalmente graves, indicando total falta de autorresponsabilidade e disciplina do custodiado sobre o qual recai a persecução penal, bem com possível intenção de interferências ilegítimas no processo, incluindo ‘hostilidade’ a magistrados e promotores, bem como persistência da prática de ações ilícitas”, destacou o magistrado em seu despacho.
Privilégios
O documento fala ainda que Cipriano é favorecido com privilégios, como visitas extraordinárias, entrada de visitantes não cadastrados e visita de um empresário, que teria ingressado no sistema se apresentando falsamente como advogado.
Ele também conversa com a mulher sobre a possibilidade de provocar matérias jornalísticas contra o Ministério Público e/ou Gaeco, e faz chamada de vídeo para falar com a filha.
‘Trabalho’ para o juiz
Em outro momento, Daniela Rebelo pede o nome do juiz do caso do marido e dos promotores do Gaeco para fazer aquilo que chama de “trabalho”.
O material apresentado pelo Ministério Público tem mais de 28 páginas e foi analisado pelo juiz Bruno Rulière nesta segunda-feira (19), que prontamente determinou a transferência.
“Impõe-se a transferência de réu Marcos Cipriano De Oliveira Mello para estabelecimento prisional que se revele capaz de inibir adequadamente e efetivamente atos ilícitos noticiados. Determina-se a transferência, pelo prazo mínimo de 10 (dez) dias (observada a necessidade do caráter transitório da medida extrema), do réu para unidade de segurança máxima”, determina Rulière, que revoga ainda a prisão especial que o delegado teria direito.
Delegado há mais de 20 anos
Marcos Cipriano era delegado há mais de 20 anos e já ocupou o comando de várias delegacias. Desde o ano passado, ele era investigado pela Corregedoria da Polícia Civil por uma ligação telefônica com Ronnie Lessa, apontado como o assassino da vereadora Marielle Franco.
Na época, Cipriano negou as acusações e alegou já ter prestado esclarecimentos sobre o caso. Ele acrescentou que a ligação aconteceu antes de Lessa ser acusado pelo homicídio de Marielle.
Em setembro do ano passado, Cipriano teve a indicação aprovada pela Assembleia Legislativa do Estado do Rio de Janeiro (Alerj) como conselheiro para a Agência Reguladora de Energia e Saneamento Básico do Rio (Agenersa).
A Agenersa afirmou que não comentaria a prisão do conselheiro, “uma vez que se trata de fatos que não estão relacionados às atividades da agência e que ocorreram no período anterior à nomeação”. | G1