“Qual é a sua graça?”. A pergunta, que, à primeira vista, pode soar deslocada, não está em um livro do século XIX. Também não era uma tentativa de flerte. Pelo contrário: era o início de uma transação comercial ilícita, pelo Whatsapp. O produto em questão era nada menos que um histórico escolar do Ensino Médio.
O anúncio, feito em um site de compras, está disponível para quem quiser ver. “Se você está precisando ou conhece alguém que ainda não terminou o segundo grau e está precisando do seu histórico escolar, chama no chat”, informam, no site OLX, os responsáveis pela mutreta, que dizem morar no bairro de Pernambués, em Salvador.
Mas a plataforma pode ser qualquer uma: a cada dia que passa, esses vendedores estão menos escondidos. O Facebook também é um dos destaques, junto com o já tradicional Mercado Livre. Entre itens ilícitos e bizarrices – que, por vezes, também são ilegais -, é tudo às claras, sem qualquer tentativa de esconder.
Certificados de conclusão do Ensino Médio, diplomas que podem ser alterados de acordo com a necessidade do comprador e de uma dose de Photoshop à mão, remédios tarja preta, ovos de aves exóticas (já fecundados), ideias (sim, ideias), sangue de demônio e até amigos (isso mesmo: pessoas).
“(O crime) Não muda por ser na internet. Pode ser estelionato, propaganda enganosa… Até tráfico de drogas. O consumidor também tem que ficar atento a esses anúncios, ver se o site é seguro, se não tem ilicitude na venda”, explica a delegada Dalina Otero, titular da Delegacia do Consumidor (Decon).
Secretário
A entrega do histórico escolar é rápida: em média, 24 horas. Aqui, vamos dizer que a graça do vendedor do início do texto é Heleno*. Ele segue no processo de convencimento do cliente. Tem que dar a certeza de que o histórico funciona para o que o comprador quiser: emprego, faculdade…
Pela bagatela de R$ 200 à vista, você pode eliminar uns quinze anos escolares de sua vida e ir direto para a faculdade ou conseguir o emprego que quer. A entrega é sempre feita na Rodoviária ou no Shopping da Bahia. “Ao receber seus dados, encaminho para o secretário. Quando estiver pronto, mando uma foto para você estar conferindo (sic) seus dados”, explica. Depois, é só marcar a entrega.
No Whatsapp, Heleno* (à esquerda) vende históricos por R$ 200. O print ao lado foi um dos encaminhados por ele, no qual um cliente conta que a compra deu certo (Imagem: Reprodução/Whatsapp)
Mas que secretário? Ele responde que é o que trabalha na escola. Diz que é funcionário do Colégio Estadual Kleber Pacheco, localizado em Pernambués mesmo. Quando a possível cliente parece querer desistir, nosso microempresário diz que o serviço é confiável. Tem dezenas de pessoas que pegaram e ‘fizeram questão de agradecer’.
Para comprovar o que diz, encaminha pouco mais de uma dezena de prints da tela do Whatsapp. São conversas com clientes. Em todas, as pessoas agradecem pelo serviço. Algumas mandam áudios. “Consegui me matricular, deu tudo certo. Obrigado pela agilidade”, diz um. Outro conta que conseguiu um emprego em uma empresa de grande porte. “Bate certo o histórico”, diz outro.