ARTIGO | Reconvexo (Padre Carlos)*




Por padre Carlos – Quando ouvimos Caetano, temos a impressão que estamos em qualquer lugar do mundo. Nesta viagem, podemos ser a chuva que lança a areia do Saara sobre os automóveis de Roma ou a sereia que dança.  



A destemida Iara água e folha da Amazônia. Assim posso viajar em meus sonhos como um menino no seu álbum de figurinhas. Posso beber de qualquer cultura, com tanto que eu não me esqueça da Bahia da sombra da voz da matriarca da Roma Negra com suas ladeias e o Sr. Do Bonfim.

 Com os pés fincados em Santo Amaro da Purificação. Reconvexo não é apenas uma resposta a Paulo Francis*, mas uma declaração pública de amor que o poeta faz ao Brasil, a sua cultura e ao seu povo.  
Eu sou a chuva que lança a areia do Saara, sobre os automóveis de Roma. Eu sou a sereia que dança. A destemida Iara, água e folha da Amazônia. Eu sou a sombra da voz da matriarca da Roma Negra.
O menino do recôncavo, ama seu povo com todos os sentidos: Você não me pega! Você nem chega a me ver! Meu som te cega, careta, quem é você? Que não sentiu o suingue de Henri Salvador. 


Acredito que o careta não sentiria por se tratar do suingue de um negro da Guiana Francesa, Henri Salvador, perdido em Copacabana, influenciando a bossa nova do branco Vinicius.
         Que não seguiu o Olodum balançando o Pelô. E que não riu com a risada de Andy Warhol E não se encantou com suas imagens.  Que não, que não e nem disse que não. Na verdade o careta não responde, não tem argumentos, está vendido a cultura estadunidenses. Não conhece sua terra, despreza a sua gente.

Eu sou um preto norte-americano forte, com um brinco de ouro na orelha. Mesmo quando bebo em outras culturas, minha visão se volta para os que querem igualdade e justiça.


Eu sou a flor da primeira música, a mais velha, a mais nova espada e seu corte. Fui influenciado e rendo homenagem a Dorival e a João, mas não fujo a responsabilidade de cuidar dos novos baianos e da cultura que vem dos afoxés. Sou o cheiro dos livros desesperados, sim de uma cultura também dos livros, das academias.

Sou Gitá Gogóia, seu olho me olha mas não me pode alcançar. Sim, sou Gita sou também esta cultura milenar, sou hindu Mahabarata, o Bhagavad Gita (A Canção do Senhor), sou o texto sagrado mais popular do hinduísmo. Sou Bhagavad Gita, Krishna expondo os pontos cruciais do hinduísmo. Sou a Fruta Gogóia.


Não tenho escolha, careta, vou descartar. Não tem jeito careta, vou ter que lhe ignorar!

Quem não rezou a novena de Dona Canô, quem não entende a religiosidade de um povo, não conhece sua cultura, participar de um caruru ou rezar uma novena.

Quem não seguiu o mendigo Joãozinho Beija-Flor,  pobres que gosta de luxo!
Quem não amou a elegância sutil de Bobô. Você não viu careta o Bahia campeão!
Quem não é Recôncavo e nem pode ser reconvexo. Só os amantes podem ser tudo e não ser nada.

Nota da redação:* No texto, ESCRITO HÁ TRINTA E DOIS ANOS, Francis se referia a Caetano como aquele que “fala de tudo com autoridade imediatamente consagrada pela imprensa, que é mais deslumbrada do que o público em face dele.” Segundo o jornalista, ele havia se transformado num “totem”. Leiam: “[Caetano] prefere fazer o que chamei outro dia de ‘maltrapilho estilizado’. Simbolizar a miséria raquítica do baiano e interiorano brasileiro, para efeito de mero consumo visual, enquanto muito agradavelmente acaricia as fantasias de amor ilimitado que fazem o narcisismo da classe média confortável no Brasil, um conforto por que pagam cerca de 100 milhões de brasileiros no nosso ‘Alagados’ nacional”. 

SOBRE O AUTOR E O CONTEÚDO POSTADO
* (Padre Carlos Roberto Pereira, de Vitória da Conquista, Bahia, escreve semanalmente para esta coluna)

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