Os municípios de Caraíbas, Itaju do Colônia, Itarantim e Maiquinique, no sudoeste baiano, compartilham semelhanças notáveis em termos de desenvolvimento humano e condições demográficas. A população varia entre 6 mil, na menos populosa (Itaju) e 17 mil, na mais (Itarantim). São locais com indicadores sociais frágeis nas áreas dos direitos humanos, da saúde, educação, meio ambiente e da infância e juventude.
Agora, elas também foram selecionadas pelo Ministério Público da Bahia como as primeiras cidades a serem contempladas pelo projeto ‘Raízes da Cidadania’, iniciativa desenvolvida em parceria com o Programa das Nações Unidas pelo Desenvolvimento (Pnud) para reverter, em até dois anos, os indicadores. Nesta quinta-feira, dia 7, os Municípios assinaram termos de adesão ao projeto, durante a programação do PGJ Itinerante, em Vitória da Conquista.
No início desta semana, promotores de justiça do MPBA e equipes técnicas realizaram a primeira etapa de um mapeamento detalhado dos principais serviços públicos dos quatro municípios e apresentaram as metas, objetivos e diagnósticos prévios do projeto para gestores, lideranças e representantes da sociedade civil locais em reuniões públicas realizadas nas Câmaras Municipais e centro de convivência, com participação dos prefeitos, vereadores, secretários, conselheiros municipais e população em geral.
Foram visitadas unidades escolares, de saúde, conselhos tutelares e de assistência social e casas abrigo que acolhem crianças e adolescentes vitimizados. Informações foram coletadas junto às equipes técnicas para instruir os procedimentos administrativos instaurados, por meio dos quais as Promotorias de Justiça fomentarão e acompanharão o desenvolvimento de políticas públicas, junto com a atuação especializada do Pnud no monitoramento dos indicadores.
“É um projeto que busca identificar óbices ao desenvolvimento humano, primando por assegurar direitos fundamentais sociais nesses municípios, buscando também a sustentabilidade, com atuações desenvolvidas em pela parceria com o Pnud”, afirmou a promotora de Justiça Patrícia Medrado, coordenadora de Gestão Estratégica e patrocinadora do ‘Raízes’.
Além dela, fizeram as visitas os coordenadores de Educação, Criança e Adolescente, Meio Ambiente, Saúde e Direitos Humanos, respectivamente os promotores de Justiça Adriano Marques, Ana Emanuela Rossi, Augusto César Matos, Rocío Garcia e Rogério Queiroz, junto com os promotores de Justiça locais Marco Aurélio Rubick, Maria Imaculada Paloschi, Millen Castro e Karina Costa, apoiados por equipes técnicas de servidores do MP.
Itaju do Colônia
“Falta emprego, o que faz nossos filhos e netos saírem para longe atrás de trabalho. Deveria também haver parquinhos na cidade para as crianças”, disse Ana Silva, 46 anos, nascida e criada em Itaju do Colônia, mãe e avó. Na cidade, a falta de oportunidade de trabalho é as das principais queixas. Foi o que ressaltou a pedagoga Carine Santos, moradora da cidade. “Eu amo Itaju, gosto muito de morar aqui, apesar de ser uma cidade pequena, mas a dificuldade é sobre a questão do emprego, que é só relacionado à Prefeitura, e são poucos, porque também são poucos estabelecimentos comerciais. Esse é o nosso ponto negativo”, disse.
Itaju também vem sofrendo com evasão escolar. Na escola Municipal Professora Geovanina Rocha Correia, desde julho deste ano, foram registrados 34 alunos do 6º ao 9º ano considerados evadidos, com ausência às aulas por mais de 30 dias. Outra questão é ausência de aterro sanitário, apontada como um problema ser enfrentado pelo próprio prefeito durante a reunião pública.
A promotora de Justiça Karina Costa, da comarca de Itororó, que abrange Itaju, ressaltou que o trabalho está começando e com o diagnóstico que está sendo construído será possível avançar em políticas que ataquem essas e outras questões, visibilizando ações já em andamento que possibilitem a captação de recursos públicos estadual e federal. Coordenador dos Direitos Humanos do MP, o promotor Rogério Queiroz observou que a falta de oportunidade de trabalho e o tempo e perspectiva de estudo impactam diretamente nos indicadores sociais.
Maiquinique
A evasão escolar é uma preocupação também em Maiquinique. Lá 374 alunos do 6º ao 8º ano estão estudando temporariamente na Escola Municipal Gionete dos Santos, devido à interdição do prédio da Escola Municipal Nataniel Souza Silveira, desde 2022, por risco de desabamento, apesar de ter sido construído há dois anos e meio. O edifício provisório, localizado em um terreno afastado e de difícil acesso, sofre com constantes alagamentos após as chuvas. A entrada da escola acumula sujeira e lixo, há capim alto e tijolos para obras por fazer no pátio externo, também ocupado por motos estacionadas de forma desordenada.
Na Gionete, falta espaço adequado para atividades esportivas, e alunos relataram que, em 2024, não tiveram uma única aula de educação física. “Mais que trazer, queremos fazer a criança e o adolescente permanecer na escola, melhorando a qualidade do ensino e a estrutura da educação nos municípios”, afirmou o promotor de Justiça Adriano Marques, coordenador da área de Educação do MP. Maiquinique registrou em 2023 uma evasão de 13,7%, conforme dados oficiais. Neste ano, as estatísticas apresentadas pela secretaria municipal de Educação já apontam para um quadro muito mais animador. Do total dos 470 alunos dos chamados anos finais do ensino fundamental (6º a 9º), apenas nove (cerca de 2%) foram identificados em situação de abandono/evasão, o que significa mais de 30 dias de ausência nas aulas.
A iniciativa do ‘Raízes’ aumentou a expectativa de que as políticas públicas sejam efetivamente implantadas. “Reunião muito positiva. A gente espera que, como o Município já abraçou a causa, esse projeto seja efetivamente implementado”, afirmou Ivan Pereira da Silva, nascido e criado em Maiquinique, presidente do Conselho Municipal de Educação.
Itarantim
O diagnóstico prévio apontou necessidade de desenvolver estratégias mais eficazes para garantir uma cobertura vacinal mais abrangente e de priorização no cuidado e no acompanhamento de pacientes com doenças crônicas. Lá, a iniciática do ‘Raízes’ também foi bem recebida pelo Município. A própria secretária municipal de Assistência Social acompanhou as visitas que os membros do MPBA fizeram ao Colégio Municipal Grupo Escolar José Guilherme e à Casa de Acolhimento Casa Lar Itarantim. Coordenadora da Casa Lar, Milene Cordeiro afirmou acreditar que o apoio do MP pode ajudar o trabalho no local. “As crianças que sofrem as vulnerabilidades são o nosso foco e, com esse projeto, com o apoio do MPBA, acreditamos que as necessidades do nosso público poderão ser alvo de novas políticas públicas”, afirmou. A promotora de Justiça Maria Imaculada, que atua no município, destacou que “a conscientização do gestor municipal é decisiva para o processo de desenvolvimento do projeto e das políticas públicas”.
Caraíbas
Um dos indicadores que chama atenção em Caraíbas é a inexistência de sistema coletivo de coleta, tratamento e disposição final de esgotos sanitários. Apenas 33,75% dos resíduos sólidos são coletados, e destinados a um lixão. O município também não conta com instâncias municipais do Sistema Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional (Sisan) e do plano municipal da primeira infância, que são fundamentais para a captação de recursos federais que financiarão ações e projetos. As equipes do MPBA fizeram visitas ao Conselho Tutelar, ao Centro de Referência de Assistência Social (Cras) Florindo Lima e ao Centro de Saúde Santo Antônio. Os gestores municipais, o atual prefeito e o eleito estiveram presentes na reunião pública, além de vereadores. O prefeito eleito acompanhou a visita do MP ao Cras.
Raízes da Cidadania
Desenvolvido em parceria com o Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD), o projeto busca reverter indicadores sociais frágeis em dois anos em 20 municípios baianos nas áreas de educação, saúde, direitos humanos, meio ambiente, criança e adolescente, priorizando a redução da evasão escolar e da mortalidade infantil, o fortalecimento da atenção primária em saúde e melhorias na cobertura do saneamento básico. O ‘Raízes’ representa um fortalecimento da atuação estratégica institucional e interinstitucional, promovendo a construção e execução sistematizada e monitorada de políticas públicas resolutivas destinadas a transformar a realidade social da Bahia, especialmente nos municípios e localidades com população mais vulnerabilizada em seus direitos e no acesso aos serviços públicos.
Fotos: Isaac Oliveira e Humberto Filho